Maria Góes lança mão das lembranças da infância
para compor suas telas
Crédito da foto: Suyene Correia
Publicado originalmente no site do jornal CINFORM, em 01 de
abril de 2019
Da Linha e do Linho nascem as telas de Maria Góes
Por Suyene Correia [redacao@cinform.com.br]
Está em cartaz, no Café da Gente Sergipana (anexo ao Museu
da Gente Sergipana), a exposição “A Linha e o Linho” da artista e empresária
Maria Góes. Ao todo, são 12 telas, delicadamente trabalhadas por Góes, que ao
invés de utilizar tintas e pincéis, manuseia, com destreza, a linha e a agulha,
para representar suas reminiscências da infância, vivida em Nossa Senhora da
Glória, na região do sertão sergipano.
À exceção da tela com Zé Peixe, todas as outras fazem alusão
a cenas do interior nordestino, com sua fauna e flora típica. Não raro,
deparamo-nos com crianças brincando no quintal de casa, rodeadas por animais
como perus, galinhas, entre outros. Muitas dessas situações foram vividas pela
artista, nos primeiros 14 anos de vida, antes de vir morar em Aracaju.
“Vim para a capital, na minha juventude, com 14 anos e
estudei, inclusive, aqui nesse prédio, que hoje abriga o Museu da Gente
Sergipana, na minha época, Escola Técnica de Comércio, cujo diretor era o
professor Barreto Fontes. Trabalhei com muitas coisas, antes de ir morar em São
Paulo, mas até então, nunca tinha, efetivamente, bordado. Apesar de minhas tias
serem exímias bordadeiras, por eu ser canhota, elas nunca tiveram ‘gosto’ de me
ensinar o ofício”, conta a artista, que diz ter aprendido a bordar, observando
as tias paternas, Francelina e Dona.
Na metrópole, Maria Góes se casou e começou a ajudar o
marido no ramo do comércio. Mudou-se para o Paraná, separou-se e quando voltou
a São Paulo, enveredou de vez na arte da fotografia. Quando voltou a Aracaju,
em 1970, era uma das raríssimas mulheres a clicar os momentos inesquecíveis das
cerimônias de casamento e debutantes de importantes personalidades da terra.
“Voltei com 34 anos para Aracaju, no dia 21 de janeiro de
1970 e enveredei pela fotografia aqui, também fotografando casamentos e festas
de debutantes. Fiz um concurso para o INSS/INAMPS, para o cargo de telefonista,
mas não deixei de fotografar, sempre me capacitando com os cursos promovidos
pelos importantes laboratórios existentes no Brasil”.
Por mais de 30 anos, intercalou o serviço de funcionária
pública com o de fotógrafa de eventos. Nesse ínterim, montou uma empresa de
massa de pastel- MAGO- e, por conta desse empreendimento, viajou a Cabo Verde,
via SEBRAE, com o intuito de divulgar sua marca, além fronteira. Foi lá, na
casa do embaixador brasileiro, que sua relação com o bordado se iniciou.
“Foi num jantar, na casa do embaixador brasileiro, nascido
no Rio de Janeiro, que observei uma cortina da sala, muito bonita, onde havia
uma parte bordada. Tirei uma foto e, ao voltar para o Brasil, decidi me
arriscar no bordado, reproduzindo aquela paisagem impregnada no tecido. Como a
cortina estava franzida, eu não estava sabendo fazer, porque estava em 3D. Meu
sobrinho que fez Belas Artes conseguiu rabiscar o desenho e eu bordei”, revela.
O resultado foi elogiado por algumas amigas e desse gesto,
aparentemente, despretensioso, surgiria mais tarde, um reconhecimento de
profissionais gabaritados, a exemplo de Mônica Mambrini. “Ela viu logo o avesso
das telas e gostou, achou bem feito. De modo que me propôs a fazer alguns
trabalhos e colocar aqui na loja do Museu para venda. Mas eu achei melhor não
ficar presa a prazos. Daí, que Vânia Aquino, uma admiradora do meu trabalho com
bordado, decidiu me ajudar na divulgação e até me inscreveu num edital de artes
visuais do SESC/Centro, onde fui selecionada e expus 24 trabalhos, em junho de
2015”.
De lá para cá, Maria Góes já participou de outras
exposições, sendo que, só no ano passado, foram três oportunidades no Corredor
Cultural da Secretaria de Estado da Cultura. Agora, ela ganha uma individual no
Café da Gente, que segue até o final de abril.
O que chama a atenção de suas obras é a noção de
profundidade de campo e economia com os elementos em cena. Maria é cuidadosa
com o que é enquadrado e não exagera na composição, utilizando poucas cores
(mais terrosas) e evitando a poluição visual da paisagem. “Acho que isso
acontece de forma espontânea, por conta do tempo que trabalhei como fotógrafa”,
conclui.
Seja qual for a influência, é um trabalho primoroso, onde
Maria Góes desfia suas lembranças de forma simples, munida apenas de agulha,
linha e linho.
Texto e imagem reproduzido do site: cinform.com.br