Foto: Ponte Propriá-Colégio no dia da sua inauguração em 1970 (Jornal de Alagoas).
Publicado originalmente no site do Portal INFONET, em 28 de janeiro de 2021
E sem máscara!
Por Odilon Machado (do blog Infonet)
O ano era 1970.
Eu era concludente do Curso de Química Industrial da antiga Escola Superior de Química de Sergipe, aquele tempo pertencente a Universidade Federal de Sergipe.
Da Universidade, conheço muitas histórias, hoje convenientemente esquecidas, sobretudo os descaminhos de 1968, quando os de meu tempo se enojavam com o “famigerado acordo MEC-USAID”, e, sobretudo, com as Universidades, tipo “Fundação”, que haviam adotado o “abominável” Sistema de Créditos, inspirado na Universidade Americana, que chegava entre nós, “acrítica” e “bitolada”, garganta a força, pela Ditadura Militar.
Da Ditadura, sabe-se que em terras Serigy não vingou um cadáver para chamar de nosso.
Sobraram alguns cocorotes, é o que se fala em muitos choros hauridos em comissões e gratificações recebidas à custa da mãe pátria infeliz.
Infelicidades à parte, direi que àquele tempo, a Ditadura, por querer pensar um Brasil grande e viril, criara uma disciplina obrigatória, ó que terrível! de Estudo de Problemas Brasileiros.
Desnecessário dizer que a molecada em geral, detestava a matéria, muitos entendendo-a como uma “lavagem cerebral” imposta pelos “milicos”, espécie de Educação Moral e Cívica, de tempos outros, em que o civismo e a moralidade nunca foram necessários.
Em semelhantes desapreços, “Milico” era uma palavra aplicada aos militares do Exército, assim como “Samango” o era para os componentes da Polícia Militar de Sergipe àquele tempo.
Naquele tempo, bem mais, e hoje um pouco ainda, o modismo bem falante nosso, enquanto universitários, era “não ser alienado”, afinal por detrás do muro de Berlin, e nos canaviais da ilha de Fidel Castro vigia o verdadeiro paraíso popular e democrático que o Brasil precisava ser.
E ai de quem pensasse divergente!
Ainda hoje os que sobraram, repetem sua cantilena, enaltecendo aqueles caídos pecos sem madurar, nem fértil restar.
Ó, mas isso ninguém pode dizer! É preciso ter parcimônia com o erro, afinal todos erramos mais do que acertamos!
Fosse diferente, a Matemática seria a matéria dos formosos; e dos preguiçosos também!
Isso num tempo em que se dizia, em poucas academias fisiculturistas; “Só com Educação Física: não se aprende Física nem Educação!”
Mas, assim estou a dizer bobagem.
Cada um estuda o que quer, mesmo porque deve valer o teorema: “a cada um de acordo com a sua capacidade”, contanto que eu não tenha de entregar minha próstata, em nome da igualdade de oportunidades, ao bisturi do carniceiro.
Falo de igualdade de oportunidades, porque este era o discurso da minha juventude. Um sonho pueril, quando a micção era fácil, a próstata nada impedia e muitos só queriam vencer na vida sem esforço, nem capacitação, como acontece ainda, sem provas, e por disputa de melhor “peixada”.
Não sei o porquê deste nome “peixada”.
Podia ser uma buchada ou maxixada, mas aí sobraria dúvida, se com xis ou ch, em confronto de ocasião…
Mas, o que é que há? Estarei querendo esculhambar? Dizendo que todos eram assim? Não! Só a grande e infinita maioria!
Para ver a exceção, é só perquirir os Diários Oficiais e os demais anais, estaduais e municipais, e sobretudo o Federal, a partir da Constituição Cidadã, que numa penada só, tornou estáveis, alforriando-os todos os que nunca fizeram um certame público na vida. Aqueles que ingressaram no serviço público; “na peixada”; no compadrio, não interessa de quem.
Mas, por que falar nisso, se o povo gosta assim?
Só para consignar!
Dito isso, volto à Disciplina “Estudo dos Problemas Brasileiros”, que nos idos de 1970 foi ministrada por um mestre que me ficou na memória em doçura, excelente cultura e paciente compreensão: Professor Antônio Xavier de Assis, então Desembargador Estadual.
Suas aulas eram um exercício lúcido do debate; um desafio aos jovens, um refrigério inteligente e arguto, num tempo de muitas insatisfações político-ideológicas, que o mestre conseguia desviar, sem desmerecer nem partilhar, preferindo instigar a criatividade daqueles futuros Técnicos e Engenheiros, para discutir a política dos grandes desafios do Estado e da Nação, seus problemas e necessidades permanentes.
Sergipe, naqueles anos e em outros que viriam depois, discutia a questão dos sais evaporitos em jazigo perpétuo inexplorado, o porto se estuarino ou offshore, alguns brigando para ver os navios singrando o Rio Sergipe, acenando Aracaju, a BR101 carente de asfalto, e a Ponte Propriá-Colégio, hoje, cinquenta anos passados, sendo inaugurada a duplicação após uma longa espera, em tantos Presidentes indiferentes: FHC, Lula e Dilma, et caterva.
Este estudo, repito tosco e despretensioso, agradou sobremodo ao Professor Assis, que me deu uma nota excelente.
Uma lembrança que jamais esqueci, junto com o seu sorriso, compreensivo e estimulador.
Voltando ao tempo, os que se lembram ainda, sabem que o transporte rodoviário de Sergipe para o restante do nordeste se fazia preferentemente via balsa em Neópolis-Penedo.
A ponte Propriá-Colégio esvaziaria este fluxo de balsa, Penedo passando a exibir uma imponência menos festejada por passantes.
Concebida para ser rodoferroviária, em duas pistas, a ponte permitiria também a navegabilidade pelo Baixo São Francisco.
O único problema existente, e que não o era então, era a necessidade de interrupção do tráfego rodoviário quando da passagem dos trens, já que sua largura não permitiria compatibilizar uma via férrea com a rodovia em via única.
Se o módulo elevatório da ponte foi erguido alguma vez, nestes cinquenta anos de vida, não o sei.
Já as locomotivas, todos sabemos que a Rede Ferroviária Federal Leste Brasileira, em cláusulas de país capenga, rareou-nos, deixando poucas lembranças.
Agora, cinquenta anos depois, vem o Presidente “genocida, homofóbico e catastrófico” inaugurar a duplicação da Ponte Propriá-Colégio, neste nosso “fim-de-mundo” que o sul-maravilha tanto despreza.
Em seu reforço, a crônica local sente-se incomodada, sobremodo.
O Mito não lhes é do agrado.
Que fazer?
Sempre foi assim, não é mesmo?
Para estes, bom seria que o Mito lhes carregasse a ponte nas costas, enquanto “catastrófico”, deixando-os à beira do Chico chupando mico.
Em tanta estupidez, vale até imprecar como Moisés no Deuteronômio 29,1-3, reclamando da ingratidão do seu povo: “Vós vistes tudo o que a vossos olhos o Senhor fez no Egito ao Faraó, a todos os seus servidores e a todo seu país: as grandiosas provas que os vossos olhos viram, os grandes sinais e prodígios. Até hoje, porém, o Senhor não vos deu um coração que entenda, olhos que vejam e ouvidos que ouçam. Por quarenta anos, vos conduzi através do deserto,… para reconhecerdes que eu, o Senhor, sou vosso Deus”.
Se nem os judeus errantes no deserto encontraram olhos para ver e ouvidos para escutar as realizações de seu Senhor, que dizer do Mito, que nem senhor o é?
E é um presidente apenas, a ser derrubado!
Voltando agora para mim, derribado por outro excesso de vontade, eu não irei ver o Mito na Ponte como gostaria.
Melhor ficar em casa contra a vontade.
Mas… bem que eu gostaria. E sem máscara!
Texto e imagem reproduzidos do site: infonet.com.br