Publicado originalmente no site do Jornal do Dia, em
14/07/2014.
Pesquisa resgata história do São Francisco.
Por Kátia Azevedo
katiaazevedo@jornaldodiase.com.br
Desde menina a ribeirinha Maria Conceição Vieira, moradora
do município de Brejo Grande, aprendeu a viver da pesca artesanal no Rio São
Francisco. "Com o rio sustento minha família, cresci ouvindo histórias,
mas hoje o São Francisco perdeu boa parte da vazante. Não tem mais tanto peixe
como antigamente. O povo ribeirinho sofre com o represamento das suas
águas", relata.
Conceição é presidente da Colônia de Pescadores de Brejo
Grande há três anos. A entidade tem 2.800 pescadores cadastrados. 50% dos
integrantes são pescadoras. Ela é a primeira mulher a presidir a entidade.
"Com o tempo, as mulheres ribeirinhas passaram a assumir
a pesca como atividade profissional, o que fortaleceu a luta organizada destas
trabalhadoras nas colônias, espaços que por muitos anos foram liderados apenas
pelos homens. Essa mudança começou a acontecer a partir de movimentos sociais
em defesa do Rio São Francisco", conta Conceição.
Relatos e histórias como a da pescadora estão reunidas em
uma pesquisa que vem sendo realizada desde 2006 pela escritora e poetisa Vera
Cristina Santana Vilar, autora de um projeto que tem como proposta resgatar a
memória e causos do Velho Chico, enfatizando sua importância para o
desenvolvimento regional e a vivência das comunidades ribeirinhas com o rio.
Ela pretende publicar em breve o livro "Pescadores do
São Francisco". Vera ressalta que além da proposta de mostrar o rio como
integrador social e econômico, a pesquisa também tem como objetivo discutir
temas como a transposição e revitalização do Velho Chico, o represamento de
suas águas gerado pela crescente presença de usinas hidrelétricas nas regiões
abastecidas pelo São Francisco.
"Já tinha iniciado este levantamento há oito anos. Com
a participação de um projeto de pesca na região em 2010 comecei a pensar numa
proposta de retratar em livro as vivências dos pescadores. Com este estudo,
quero mostrar as belezas naturais do Rio São Francisco, a riqueza do seu povo,
a sua importância histórica e regional, mas acima de tudo fazer um alerta para
a importância da preservação desse patrimônio do povo brasileiro", destaca
Vera Vilar.
A ideia de realizar a pesquisa, segundo ela, surgiu a partir
de uma preocupação em retratar e dar visibilidade ao trabalho dos pescadores
revelando a importância do rio nas práticas cotidianas das comunidades
ribeirinhas, os impactos ambientais do represamento das águas e a necessidade
de uma agenda do poder público para a revitalização do Velho Chico.
"A proposta é lançar um livro contando o trabalho das
colônias, as lendas que estão no imaginário coletivo da população que vive às
margens do São Francisco, a diversidade ecológica, a cultura local, mas acima
de tudo fazer dessa pesquisa um instrumento de denúncia e de luta pela
preservação do Velho Chico, chamando a atenção para a fundamental implantação
de políticas públicas que envolvam a revitalização do rio", explica.
Vera nasceu na cidade de Propriá, um dos municípios afetados
pela grande degradação ambiental envolvendo o Velho Chico. "O rio perdeu a
vazante e a situação da pesca tem priorado muito. Poucas embarcações conseguem
atravessar", relata.
O trabalho da pesquisa vem sendo feito nos municípios de
Propriá, Brejo Grande, Pacatuba, Ilha das Flores, Santana do São Francisco,
Neópolis e Cedro, e por enquanto conta apenas com o apoio das colônias de
pescadores como a de Brejo Grande, Ilha das Flores e Neópolis, além de algumas
prefeituras locais.
"Já visitei os pescadores dos povoados Betume,Tapera,
Alto Santo Antônio, Pindoba e Mussuípe com o apoio da Colônia de Pescadores de
Neópolis", relata.
A pesquisa também contempla as cidades de Gararu, Porto da
Folha, Poço Redondo, Pacatuba, Telha e Canindé e os povoados destas cidades
onde a pesca tem um destaque maior.
O projeto tem duração de 6 meses para sua conclusão. Vera
espera por apoio para publicar "Pescadores do São Francisco", o seu
quarto trabalho, que está sendo produzido com recursos próprios. Ela é autora
de três livros de poesias- "Aparas do Tempo", "O Ritmo das
Palavras" e "Em Pedaços".
A escritora também já foi homenageada com o prêmio Abdhias
do Nascimento, na Assembleia Legislativa de Sergipe e no Memorial do Teatro
Sergipano. "Espero que o poder público e a iniciativa privada se somem a
esta causa, de preservação do Rio São Francisco", enfatiza. Os
interessados podem entrar em contato com a escritora pelo (79) 9830-1563 ou
através do e-mail poetisaveravilar@hotmail.com
Para a ribeirinha Conceição, Pescadores do São Francisco
representam também uma oportunidade de dar visibilidade para os trabalhadores
que vivem da pesca em Sergipe, especialmente os que sobrevivem do Velho Chico.
"Essa classe de trabalhadores ainda sofre com pouca
assistência do poder público e com a morte lenta do Rio São Francisco, que faz
parte da história do povo ribeirinho", lembra.
Texto e imagens reproduzidos do site: jornaldodiase.com.br