João Augusto Gama: dizendo das razões pelas
quais não disputou a reeleição em 2000
Legenda da foto: Gama em dois momentos:
no da posse em 1997 e em visita a Fidel Castro
em Havana, no mesmo ano
Entrevista publicada originalmente no site JLPOLÍTICA, de 18 de novembro de 2024
No livro “Memória de um político”, João Augusto Gama expõe sua visão de vida e se diz “de esquerda”
Por Jozailto Lima (Coluna Aparte)
“Memória de um político”: livro de Gama que sai às 17 horas no Museu da Gente Sergipana
Este 19 de novembro de 2024, terça-feira, foi reservado pelo político e empresário João Augusto Gama, 77 anos, como o dia que ele decidiu despejar sobre a memória dos sergipanos muito da sua própria memória existencial.
E isso será feito com o lançamento do livro “Memória de um político”, a acontecer às 17 horas no Museu da Gente Sergipana. A obra bem que poderia chamar-se “Memória de um político e de um empresário bem-sucedido”, porque é exatamente isso que é João Augusto Gama.
E um dado bom: Gama não vai abusar na exposição de si mesmo e de sua vida dupla, ou multivária, que vai do sujeito empreendedor do mercado empresarial ao empreendedor “do mercado político”, tendo sido um prefeito determinante de Aracaju entre 1997 e 2000.
Ele vai dizer muito de sua posição de figura de esquerda e reativo às diabruras da ditadura miliar brasileira, da qual foi prisioneiro por duas vezes - numa delas, ainda de menor.
Tudo virá numa publicação em torno de 150 páginas. “É um livro curto, seco, direto. (Nele), o leitor vai avistar toda a minha trajetória de vida desde a infância, passando pela adolescência, a formação escolar, e a vida política e empresarial. Estará tudo lá”, promete.
A obra tem prefácio do professor Jorge Carvalho e orelha de Francisco Carlos do Nascimento Varella, o velho Chico Varella. Ambos são amigos do autor.
Enquanto político e empresário, Gama se declara um ser “totalmente à esquerda”, mas tem a humildade de não chamar para si a exceção nessa posição. “Não é incompatível você ser do capital e ter vocação da esquerda”, diz ele.
“Você vai encontrar no Brasil homens brilhantes, como o José Ermírio de Moraes, que é o capitalismo na sua expressão mais pura, que sempre tiveram posições senão de esquerda, mas progressistas. Eu não chamaria José Ermírio de um homem de direita”, revela Gama. Veja nesta breve entrevista o que ele diz sobre o livro a ser lançado neste dia 19.
João Augusto Gama: dizendo das razões pelas quais não disputou a reeleição em 2000
Aparte - Em síntese, o que é que o leitor vai avistar neste seu livro “Memórias de um político”?
João Augusto Gama - O leitor vai avistar toda a minha trajetória de vida desde a infância, passando pela adolescência, a formação escolar, e a vida política e empresarial. Estará tudo lá.
Aparte - Laonte Gama, seu irmão e ex-deputado estadual, era uma ocorrência política isolada na sua família até a sua entrada na política ou houve algum outro antepassado seu que caiu nessa rede?
JAG - Aqui em Sergipe, ele foi uma ocorrência isolada. Mas fora e antes, não. Nós vamos ter uma presença política familiar na Paraíba, quando o meu bisavô materno Antônio Alfredo da Gama e Melo foi senador e foi governador - presidente da Província da Paraíba. É possível encontrar isso na internet e o meu avô veio para cá trazendo essa referência.
Aparte - Antônio Alfredo da Gama e Melo vai aparecer no livro?
JAG - Não, porque ele não tem nenhuma participação na minha vida. Aparece apenas como reminiscência, como uma informação passada.
Aparte - Por que o senhor é um nascido em Aracaju...
JAG - Sim, na Rua Duque de Caxias, 120, e pelas mãos de Dona Edilde, a parteira.
Aparte - Em “Memórias de um político” o senhor vai entrar em juízo de valores dos nossos supostos pendores para uma certa tirania política, como as do Estado Novo, da Ditadura Militar e as do recrudescimento da nova direita atual?
JAG - Começando pelo fim da sua pergunta, devo dizer que o recrudescimento da nova direita muito me assusta. E, pelo começo, posso lhe dizer que eu trato, porque é parte intrínseca da minha biografia e dos fatos da minha vida, inclusive a participação na luta contra ela, da ditadura lá atrás, a de 1964 - eu já adianto que fui preso naquele ano, sendo ainda menor, e em 1968, já de maior, como presidente do Diretório Central dos Estudantes. Foi em Aracaju e em São Paulo.
Aparte - Mas não é papel do livro conceituar esses supostos pendores? O senhor não para pra fazer uma tese disso!
JAG - Não. Até porque analisar essa crise, o papel da República, as nossas tradições culturais,
ditatoriais, a influência do militarismo na história política do Brasil e por aí vai, seria motivo para um outro livro.
Aparte - Retomando aquela informação das prisões, então o senhor foi preso em 1964 ainda menor ou somente em 1968, durante o Congresso de Ibiúna, em São Paulo?
JAG - Fui preso nos dois momentos. Em abril de 1964, quando eu era ainda menor de idade. Tanto que Tertuliano Azevedo, no seu livro de memórias, conta esse fato. Quando o Exército descobre que eu era menor ou, como diz o povo, de menor, aí eles me liberam pela parte da tarde.
Aparte - Quais foram seus dois crimes para merecer as duas prisões?
JAG - Foram os da suposta subversão da ordem pública e a reunião ilegal de pessoas. No que você fosse pego no Código Penal Militar, eles enquadravam a gente. Éramos vítimas da má vontade política do momento, porque era uma ditadura.
Aparte - Seu livro vai justificar porque o senhor se retirou da possibilidade de uma reeleição de prefeito em 2000, quando o direito lhe assistia ir à disputa?
JAG - Vai. Eu contarei nele das exigências que me foram feitas e que, se eu as assumisse, iria inviabilizar minha nova e futura administração. E veja que já havia ali a Lei de Responsabilidade Fiscal. Porque eu encontrei em 1997 a Prefeitura de Aracaju em estágio de tragédia, mas não havia a Lei de Responsabilidade Fiscal ali ainda.
Aparte - O senhor poderia adiantar um pouquinho dessas exigências?
JAG - Posso: algumas séries de obras e pedidos de ajuda para campanha acima da minha possibilidade financeira. Então aquilo me motivou a não avançar. Eu achei que tinha e deixava uma marca na sociedade sergipana, como deixei realmente e que até hoje é difícil o dia em que alguém não diga que é um admirador meu. Ainda ontem eu vinha em um avião de Recife e uma pessoa disse exatamente isso. Eu não poderia macular essa história.
Aparte - A sua candidatura de senador depois, então, é uma demonstração de que o senhor havia parado na hora errada? De que o senhor ainda queria mais política?
JAG - Exato. Posso dizer que sim. E, na verdade, eu conto no livro a história da eleição do Senado, na qual fui totalmente traído pelo PT. Naquele momento eu tive a correção apenas de Marcelo Déda, de Zé Eduardo, que foram muito sensatos comigo, e nacionalmente de Zé Dirceu. Mas o restante do partido aqui votou em todo mundo, menos em mim. Isso é um fato notório e irrefutável.
Aparte - O senhor tem mais orgulho do que restrição ao seu velho MDB?
JAG - Nenhuma restrição. Tenho mais orgulho. O MDB foi um marco importantíssimo na vida de todos nós que reagimos à Ditadura. De toda uma geração. Ou melhor: de diversas gerações que lutaram contra o regime militar.
Aparte - No livro o senhor vai tratar do acordo entre Jackson Barreto e Albano Franco em 1998, mas com uma mea-culpa ou não pela sua ação em favor daquela aliança?
JAG - Não vou fazer uma mea culpa. Aquilo foi, em parte, uma ideia minha, mas não tenho porque fazer mea-culpa, porque aquela aliança nos ajudou a administrar bem Aracaju até o ano 2000. Fizemos alguns bons acordos para obras, embora seja verdade que o Governo do Estado não cumpriu todos. Mas tirou a Prefeitura de Aracaju de um momento de crise financeira enorme que eu havia herdado do meu antecessor José Almeida Lima.
Aparte - Mas aquele acordo tirou também o mandato de senador de Jackson Barreto.
JAG - Sim, é verdade. Mas esse foi o risco que ele correu. E ele sabia disso. Eu acho que a culpa nossa foi a de não ter passado para a sociedade o real motivo do nosso acordo, que era republicano e sinalizava para obras.
Aparte - O senhor acha que o que restou na memória coletiva da sua passagem como prefeito bate com a avaliação que o senhor tem daqueles quatro anos?
JAG - Acho que bate perfeitamente. Eu não tenho dúvida disso. Até porque, onde eu chego as pessoas rememoram, falam, comentam, lembram muito do Mercado Central. Eu encontro muitas pessoas que receberam as escrituras públicas das suas casas no bairro São Carlos. Isso tudo me dá muito orgulho. Eu tenho certeza de que cumpri com louvor o meu dever de gestor.
Aparte - Então o senhor tem certeza de que a avaliação é mais positiva do que negativa?
JAG - Tenho sim. E devo dizer mais: naquele momento era uma Prefeitura pobre e não a Prefeitura rica que a companheira Emília Corrêa está recebendo agora. Não era parecida com a de hoje.
Aparte - O senhor veria maldade deliberada naqueles que associam a sua boa ascensão empresarial a partir do momento em que vira prefeito de Aracaju, em 1997?
JAG - Olha, isso para mim é irrelevante. Devo apenas dizer que em 1994, quatro anos de ser eleito prefeito, eu fui eleito o Comerciante do Ano de Aracaju. Então eu não era um Gama qualquer - isso era 1994, antes de eu me envolver em política partidária. Eu era ali um representante da Tigre e um distribuidor da Shell. Eu já tinha uma empresa importante no bairro José Conrado de Araújo, cuja sede ainda está lá, é nossa - quer dizer, é dos meus filhos.
Aparte - E o senhor tinha militância nos órgãos de entidade de classe do comércio desde antes?
JAG - Tinha. Fui presidente da CDL. E quando eu me candidatei a prefeito, tive que renunciar à Presidência.
Aparte - O senhor e sua conduta política, à esquerda, seriam a negação de uma máxima recorrente segundo a qual todo capital seria obrigatoriamente de direita?
JAG - Não diria exatamente isso, porque em determinados momentos da ditadura militar o capital nacional se colocou contra. Se houve uma adesão em um primeiro momento, lá em 1964, mas depois grandes empreendedores mudaram.
Aparte - Então o senhor está dizendo que não é uma exceção?
JAG - Estou, porque não sou mesmo. Você vai encontrar no Brasil homens brilhantes, como o José Ermírio de Moraes, que é o capitalismo na sua expressão mais pura, que sempre tiveram posições senão de esquerda, mas progressistas. Eu não chamaria José Ermírio de um homem de direita. E digo mais: a inteligência e a transigência podem ser de direita e ser do capital. Não é incompatível você ser do capital e ter vocação da esquerda.
Aparte - O senhor se sente de esquerda ou de centro?
JAG - Eu me sinto totalmente à esquerda. Tenho profunda admiração por Trótski.
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* O Articulista é jornalista há 40 anos, poeta e fundador do Portal JLPolítica. Com colaboração da jornalista Tatianne Melo.
Texto e imagens reproduzidos do site: jlpolitica com br
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