terça-feira, 21 de janeiro de 2014

Hermes Fontes


Hermes Fontes.

Nasceu em 28 de agosto de 1888, em Boquim/SE., filho de Francisco Martins Fontes e Maria Araújo Fontes. Hermes Fontes desde cedo chamou a atenção pela precocidade poética e inteligência. Estudou com o professor Leão Magno e, em 1896, aos 8 anos, estava em Aracaju, estudando com professor Alfredo Montes. Aos dez anos, frequentava as sessões da Assembléia Legislativa e era capaz de reviver discursos inteiros de Ruy Barbosa e do Deputado Laudelino Freire. O presidente Martinho Garcês o adotou e levou-o para a capital federal (Rio de Janeiro) onde chegou em 19 de julho de 1908. No Rio estudou e foi considerado um novo Tobias Barreto. Em 1930 esteve pela última vez em Sergipe e visitou Boquim, sua terra natal, recolhendo a visão bucólica da Fonte da Mata que resultou no seu último livro A Fonte da Mata, publicado no mesmo ano. No dia 26 de dezembro, aos 42 anos morre no Rio de Janeiro, com um tiro na cabeça, depois de amarga solidão a que estava recolhido em sua casa. Sua morte fez renascer o interesse pela sua obra jornalística e poética.

Foto e texto reproduzidos do site: prefeituraboquim.com.br

sexta-feira, 17 de janeiro de 2014

A Benção Padre!?


Publicado no Blog Minha História.
Crônicas de um Tempo, em 24.04.2008

A Benção Padre!?

Monsenhor Jason Barbosa Coelho foi pároco em Lagarto/SE por longos anos. Toda manhã ele costumava acordar a comunidade chamando seu Ascendino para tocar o sino da igreja. Além de sineiro, o velho era o jardineiro da Praça da Piedade e que também fazia o serviço de limpeza na igreja e tinha um rancho no subsolo do palanque onde guardava seu material de trabalho. Quando seu Ascendino não chegava a tempo de tocar o sino o Monsenhor pegava o microfone e chamava-o: Ascendino toca o sino! Como seu Ascendino era temperamental e às vezes emburrava com a molecada, passou a receber chacotas do tipo "Ascendino toca o sino". Monsenhor Jason era muito conservador e várias vezes expulsou moças mais avançadinhas que iam para a missa com generosos decotes ou pequenas mini-sais. Mulher de calça nem pensar em receber a comunhão. Todas as noites após a missa costumava visitar algumas famílias da praça e sempre parava lá em casa para saborear um docinho e tomar seu já reservado copo leite. Certa feita foi ele visitar o vaticano e na volta me chamou para receber um presentinho. Fui até a casa paroquial que ficava na Rua Mizael Vieira todo animado. Quando cheguei lá, veio ele com um guardanapo da Varig com alguns cubinhos de açúcar. Achei que o presente seria outro mais como não conhecia o produto guardei com satisfação por alguns dias até devorá-los. De outra feita foi ele a França e me trouxe um chaveiro com o formato da torre Eiffel. Era uma pessoa querida por seus párocos e seus restos mortais estão enterrados dentro da matriz de Nossa Senhora da Piedade. Amém!

Foto e texto postado por Floriano Fonseca,
no blog cronicasdeumtempo.blogspot

Silvio Vasconcelos da Silveira Ramos Romero

Silvio Vasconcelos da Silveira Ramos Romero
(Lagarto-SE, 21/04/1851 - Rio de Janeiro, 18/07/1914)

Sílvio Romero era crítico, ensaísta, folclorista, polemista, professor e historiador da literatura. Era filho de André Ramos Romero e Maria Joaquina Vasconcelos da Silveira. Na cidade natal iniciou os estudos primários, cursando a escola mista do professor Badu. Em 1863, partiu para a corte, a fim de fazer os preparatórios no Ateneu Fluminense. Em 68, regressou ao Norte e matriculou-se na Faculdade de Direito do Recife. Formou, ao lado de Tobias Barreto (que cursava o 4º. ano quando Sílvio se matriculou no primeiro) e junto com outros moços de então, a Escola do Recife, em que se buscava uma renovação da mentalidade brasileira. Sílvio Romero foi, no início, positivista. Distinguiu-se, porém, dos que formavam o grupo do Rio, onde Miguel Lemos levava o comtismo para o terreno religioso. Espírito mais crítico, Sílvio Romero se afastaria das idéias de Comte para se aproximar da filosofia evolucionista de Herbert Spencer, na busca de métodos objetivos de análise crítica e apreciação do texto literário.

Estava no 2º. ano de Direito quando começou a sua atuação jornalística na imprensa pernambucana, publicando a monografia "A poesia contemporânea e a sua intuição naturalista". Desde então, manteve a colaboração, ora como ensaísta e crítico, ora como poeta, nas folhas recifenses, entre elas A Crença, que ele próprio dirigia juntamente com Celso de Magalhães, o Americano, o Correio de Pernambucano, o Diário de Pernambuco, o Movimento, o Jornal do Recife, a República e o Liberal.

Assim que se formou, exerceu a promotoria em Estância. Atraído pela política, elegeu-se deputado à Assembléia provincial de Sergipe, em 1874, mas renunciou, logo depois, à cadeira. Regressou a Recife para tentar fazer-se professor de Filosofia no Colégio das Artes. Realizou-se o concurso no ano seguinte e ele foi classificado em primeiro lugar, mas a Congregação resolveu anular o concurso. A seguir, defendeu tese para conquistar o grau de doutor. Nesse concurso Sílvio Romero se ergueu contra a Congregação da Faculdade de Direito do Recife, afirmando que “a metafísica estava morta” e discutindo, com grande vantagem, com professores como Tavares Belfort e Coelho Rodrigues. Abandonou a sala da Faculdade; foi então submetido a processo pela Congregação, atraindo para si a atenção dos intelectuais da época.

Em fins de 1875, transferiu-se para o Rio de Janeiro. Foi para Parati, como juiz municipal, e ali demorou-se dois anos e meio. Em 1878, publicou o livro de versos Cantos do fim do século, mal recebido pela crítica da corte. Depois de publicar Últimos harpejos, em 1883, abandonou as tentativas poéticas. Já fixado no Rio de Janeiro, começou a colaborar em O Repórter, de Lopes Trovão. Ali publicou a sua famosa série de perfis políticos. Em 1880 prestou concurso para a cadeira de Filosofia no Colégio Pedro II, conseguindo-a com a tese "Interpretação filosófica dos fatos históricos". Jubilou-se como professor do Internato em 2 de junho de 1910. Fez parte também do corpo docente da Faculdade Livre de Direito e da Faculdade de Ciências Jurídicas e Sociais do Rio de Janeiro.

No governo de Campos Sales, foi deputado provincial e depois federal pelo Estado de Sergipe. Nesse último mandato, foi escolhido relator da Comissão dos 21 do Código Civil e defendeu, então, muitas de suas idéias filosóficas.

Na imprensa do Rio de Janeiro Sílvio Romero tornou-se literariamente poderoso. Admirador incondicional de Tobias Barreto, nunca deixou de colocá-lo acima de Castro Alves; além disso, manteve, durante algum tempo, uma certa má vontade para com a obra de Machado de Assis. Sua crítica injusta motivou Lafayette Rodrigues Pereira a escrever a defesa de Machado de Assis, sob o título Vindiciae. Como polemista deve-se mencionar ainda a sua permanente luta com José Veríssimo, de quem o separavam fortes divergências de doutrina, método, temperamento, e com quem discutiu violentamente. Nesse âmbito, reuniu as suas polêmicas na obra Zeverissimações ineptas da crítica (1909).

Sílvio Romero foi um pesquisador bibliográfico sério e minucioso. Preocupou-se, sobretudo, com o levantamento sociológico em torno de autor e obra. Sua força estava nas idéias de âmbito geral e no profundo sentido de brasilidade que imprimia em tudo que escrevia. A sua contribuição à historiografia literária brasileira é uma das mais importantes de seu tempo.

Era membro do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, sócio correspondente da Academia das Ciências de Lisboa e de diversas outras associações literárias.

Foto e texto reproduzidos do site: ihgs.com.br

segunda-feira, 13 de janeiro de 2014

A Formação Jurídica Sergipana

Tobias Barreto, liderou o movimento da Escola do Recife,
foi professor, fez política, atuou no Foro
 e produziu vasta obra de reflexão.

Publicado no site da OABSE., em 20 de janeiro de 2012.

A Formação Jurídica Sergipana.
Por Luiz Antônio Barreto ¹

Desde que foram criados e instalados em Olinda, depois no Recife, e em SãoPaulo, os Cursos Jurídicos do Brasil,que jovens sergipanos, de várias partes da Província, demonstraram interesse pela formação jurídica. A inexistência de escolas preparatórias retardou, em muito, a presença dos jovens sergipanos nas Academias de Olinda/Recife e de São Paulo. Cabe ressaltar que o Liceu Sergipense, instalado em 1847, na antiga capital da Província, concorreu para possibilitar os estudos superiores, distribuídos entre a Bahia (Medicina), Pernambuco e São Paulo (Direito), seguindo-se os cursos politécnicos e militares, em alguns pontos do País. O livro monumental de Clóvis Beviláqua, historiando os cursos jurídicos no Brasil, guarda os nomes dos jovens sergipanos que seguiram a formação jurídica, e deixaram na história das idéias uma contribuição sempre referenciada.

Muitos foram padres, militares, médicos, mas poucos conquistaram o prestígio e o reconhecimento, e dentre estes estavam os jovens bacharéis, agitando os corredores das faculdades, principalmente na Faculdade de Direito do Recife, onde houve um movimento intelectual e científico, que marcou a segunda metade do século XIX, fincando raízes e marcas profundas na cultura brasileira. Os jovens sergipanos que acorriam aos cursos jurídicos não eram, como seria possível supor, procedentes das camadas abastadas dos senhores de engenho, dos criadores de gado. Tobias Barreto, que nasceu na então Vila de Campos, era filho de um notário; Silvio Romero, natural de Lagarto, descendia de um médio proprietário rural, Fausto Cardoso, de Divina Pastora, era dos poucos originários dos engenhos. Gumercindo Bessa era outro sem riqueza, nascido em Estância. José Jorge de Siqueira Filho era outro pobre que freqüentava a Faculdade de Direito do Recife, oferecendo o talento literário que espalhou sua poesia. Ele era de Itabaiana e morreu muito jovem. Não havia, enfim, concentração geográfica e econômica digna de atenção. Ao contrário, foi essa representação pouco afortunada de jovens sergipanos, que prevaleceu.

É claro que alguns moços sergipanos chegaram ao Recife com melhores condições para estudar. Foi o caso de José Luiz de Coelho e Campos, Guilherme de Souza Campos, que tinham acesso aos influentes professores, principalmente os irmãos José Soriano de Souza, Braz Florentino e Tarquínio Bráulio, que sustentavam, nos jornais, nos livros e nas cátedras, as idéias mais tradicionais, que estavam no centro dos debates. Os jovens sergipanos enfrentaram nos corredores da escola, a força das aulas, reproduzindo um velho saber de salvação, questionado pelos jovens que abraçavam as idéias da ciência, no confronto ideológico mais radical vivido no Brasil no século XIX. Um embate desigual, que no entanto consagrou o pensamento de alguns sergipanos, cujos nomes resistem,atualizadamente, no tempo.

Tobias Barreto, Silvio Romero, Gumercindo Bessa e Fausto Cardoso formaram o quarteto mais harmonioso dos estudantes e dos bacharéis em Direito, cada um com sua ilustração,sua experiência, suas obras. Tobias Barreto, o maior deles, liderou o movimento da Escola do Recife, foi professor no Recife, fez política, atuou no Foro e produziu vasta obra de reflexão. Sílvio Romero passou pela magistratura, ensinou filosofia, fez política, refletiu sobre o Direito e deixou uma vastíssima e completa obra de interpretação do Brasil. Gumercindo Bessa seguiu, praticamente, as pegadas de Tobias e de Sílvio, anotando para a posteridade o triunfo que foi o Concurso de Tobias Barreto na Faculdade de Direito do Recife, e deixando importante contributo, conciliando o conhecimento novo com as posições firmes que sabia tomar. Fausto Cardoso, discípulo dileto de Tobias, revolucionário, filósofo, deu sua própria vida à causa que defendia, entusiasticamente.

A lição dos juristas sergipanos marcou a contribuição sergipana, como um acervo que ainda hoje tem importância, a ponto de provocar estudos atualizados, como os que são feitos por Mário G. Losano, na Itália, e Eugênio Raul Zafaroni, na Argentina, dedicados a Tobias Barreto.

TOBIAS BARRETO de Menezes (Campos, atual Tobias Barreto, 7 de junho de 1839 – Recife, 26 de junho de 1889) fez sua formação elementar em Estância, Lagarto e Itabaiana, passou, meteoricamente, pelo Seminário da Bahia, antes de seguir, com Bolsa do Governo da Província, para o Recife, onde chegou em 1862. Fez preparatórios, ensinou particular, enquanto estudante de Direito, bacharelando-se em 1869. Viveu no Recife os dois primeiros anos de formado, mudando-se para Escada, município da zona da mata sul pernambucana, Termo da Comarca de Vitória do Santo Antão e finalmente Comarca, onde foi Curador de Órfãos e de Escravos, Advogado, Juiz Municipal. Entrou na política, criando o Clube Popular Escadense, ingressando no Partido Liberal, pelo qual foi eleito Deputado Provincial, depois Vereador, em Escada. Em 1881, já consagrado pelas obras que publicou, retornou ao Recife, fez concurso para a Faculdade de Direito, e ali permaneceu até 1889, quando morreu, deixando viúva e numerosa prole. A obra de Tobias Barreto cobre os campos do Direito: (Algumas Idéias sobre o chamado Fundamentos do Direito de Punir, 1881,Sobre uma nova intuição do Direito, 1882, Menores e Loucos em Direito Criminal, 1884), de Filosofia:(Ensaios e Estudos de Filosofia, e Crítica, 1875, Questões Vigentes de Filosofia e Direito, 1888;)de Crítica: Religiosa, de Crítica Política, além do Germanismo que lhe permitiu atualizar e contemporanizar o conhecimento: (Estudos Alemães, 1883) dentre outras.

¹ Jornalista e escritor, organizador das Obras Completas de Tobias Barreto.

Imagem e texto reproduzidos do site: oabse.org.br 

A República em Sergipe - 1

 Professor Balthazar Góes.

Publicado por Infonet - Blog Luíz A. Barreto, em 15/04/2005.

A República em Sergipe.
Por Luíz Antônio Barreto.

Desde o lançamento do Manifesto Republicano, em 1870, que intelectuais e militares sergipanos aderiram a propaganda, criaram Clubes, fundaram jornais, agitando as comunidades, notadamente Aracaju, Laranjeiras, Estância e estabelecendo contatos com outras Províncias, onde alguns conterrâneos viviam. Em Penedo (Alagoas), por exemplo, o itabaianense Francisco Carvalho Lima Júnior liderou a propaganda, ajudando a criar o Clube Republicano Federal, que reuniu grande número de adeptos e participou, ativamente, das manifestações mobilizadoras ao lado do farmacêutico sergipano Josino Menezes, ali estabelecido.

No Recife (Pernambuco), entre os alunos da Faculdade de Direito, vários sergipanos assumiram publicamente o ideal republicano, do mesmo modo como defendiam a abolição da escravatura. No Rio de Janeiro o bacharel Ciro de Azevedo agitava a pequena Cantagalo, juntando adeptos para a propaganda republicana. Francisco Leite de Bitencourt Sampaio, sergipano de Laranjeiras, bacharel pela Faculdade de São Paulo, poeta, foi um dos signatários do Manifesto, como a representar, simbolicamente, sua terra e sua geração de conterrâneos.

Laranjeiras era, em Sergipe, um centro de irradiação cultural, desde 1876, quando o médico baiano Domingos Guedes Cabral chegou, com suas idéias evolucionistas, inspiradas em Herbert Spencer. Ele tivera rejeitada, na Faculdade de Medicina da Bahia, sua tese sobre As Funções do Cérebro, que externava novas teorias científicas, estimuladas após a retumbante divulgação das idéias de Charles Darwin, ampliadas por Ernest Haeckel. Tais correntes, sucessivamente renovadas, representavam “ um bando de idéias novas”, que no dizer de Silvio Romero agitava a juventude reunida em Pernambuco, em torno de figuras como Tobias Barreto, professor da Faculdade de Direito e líder do movimento intelectual que ficou conhecido como Escola do Recife.

A agitação tinha vínculos em várias partes do Brasil. Laranjeiras, espécie de capital econômica de Sergipe, especialmente da região produtora de açúcar, tinha sua imprensa, suas escolas, e dentre elas uma escola inglesa, filial de outra existente no Recife, sob a direção de Ana Carrol, e uma norte americana, protestante, fundada em 1886 e dirigida por Manoel Nunes da Mota, para consolidar a propaganda evangélica a cargo da pequena Igreja, fundada em 1884. A morte de Guedes Cabral, em 1883, não fez diminuir a marcha propagandística das teses científicas, políticas e religiosas.

O grupo de alunos de Direito, no Recife – Silvio Romero, Fausto Cardoso, Gumercindo Bessa, Prado Sampaio, dentre outros – e de Medicina, na Bahia – tendo Felisbelo Freire como o mais destacado – envolveu-se integralmente no movimento contra a monarquia, escravocrata e centralizadora, assumindo nas ruas, nas récitas, nos saraus, nos corredores das duas faculdades e na imprensa um papel amplo de discussão, de formação de uma opinião pública, cada vez mais consciente de suas responsabilidades.

Ecoava, então, em Laranjeiras o brado dos jovens intelectuais sergipanos, apoiados por uma geração de militares, que desde a Guerra do Paraguai enchiam de glória a Pátria brasileira. Militares como Samuel de Oliveira, José de Siqueira Menezes, Moreira Guimarâes, Ivo do Prado, Pereira Lobo, iriam cumprir funções destacadas, fortalecendo a campanha republicana, que a partir de 1887 fixava-se em Laranjeiras, com a criação do Clube Democrático, tendo em seu salão principal o retrato de Tobias Barreto, a inspirar suas ações. Com a entrada em circulação do jornal O Horizonte, substituindo por O Laranjeirense, em 1º de janeiro de 1887, a República ganha novo ânimo. No ano seguinte, em 1º de novembro, reunia-se o Partido ou Clube Republicano, que passava a contar com o jornal O Republicano, órgão que incorporou O Laranjeirense, ampliando a propaganda por toda a Província.

A defesa da República estava organizada, em crescimento e em ligação com os centros nacionais comprometidos com a propaganda. Em Laranjeiras o Clube Republicano contava com a participação do pequeno grupo de protestantes, tendo a frente o pastor Manoel Antonio dos Santos David, o que parecia caracterizar de forma mais radical o grupamento reunido para a luta contra o Império. Neste contexto é grande a importância do jornalista e professor Baltazar Góes, que sempre esteve na vanguarda das mudanças que ecoaram em Laranjeiras. Foi ele fundador e diretor do Liceu Laranjeirense, fundador do Clube Democrático e seu Diretor em 1887, promovendo conferências sobre A Evolução da Matéria, Leis e Causas de suas Formas, Instrução Pública no Brasil, Transformação do Trabalho, dentre outras. Foi redator dos jornais locais republicanos, signatário da ata de fundação do Clube Republicano e autor de A República em Sergipe- Apontamentos para a história – 1870-1889, livro de 1891.

Baltazar Góes não foi o único entre os integrantes do Clube Republicano a escrever sobre a propaganda e a movimentação intelectual e política em torno da Proclamação da República, Felisbelo Freire, que governou o Estado, e que publicou em 1891 a sua História de Sergipe, tem um capítulo especial sobre o movimento republicano em Sergipe na sua História Constitucional da República dos Estados Unidos do Brasil e Manoel Curvelo de Mendonça, que ingressou no movimento em favor da República aos 17 anos, sendo um dos oradores do Clube, quando da sua fundação, escreveu um estudo crítico – Sergipe Republicano, em 1896, considerado por Maria Thetis Nunes como uma contribuição de “pioneiro da historiografia social sergipana”, como o disse em conferência na Fundação Joaquim Nabuco, no Recife, dentro do Congresso Brasileiro de Tropicologia, em 1986.

Mais do que repassar as diversas fases da evolução das lutas democráticas no Brasil e em Sergipe, contrariando a Baltazar Góes, para quem a propaganda republicana começou em Sergipe apenas em 1887, Manoel Curvelo de Mendonça defende as condições da Província para estabelecer os frutos da República, destacando Laranjeiras, pelas condições econômicas e culturais como o cenário mais adequado para sediar o movimento. (Continua).

Fonte: Pesquise - 
Pesquisa de Sergipe/InfoNet. institutotobiasbarreto@infonet.com.br.

Fotos e texto reproduzidos do site:
infonet.com.br/luisantoniobarreto 

A República em Sergipe - 2

 Engenheiro militar José de Siqueira Menezes.



Sergipe Republicano de Manoel Curvello

Publição no Portal Infonet - Blog Luíz A. Barreto, em 22/04/2005.

A República em Sergipe (II)
Por Luíz Antônio Barreto.

A campanha abolicionista e a propaganda republicana andaram lado a lado em Laranjeiras, como compromissos democráticos, ainda que a luta em favor da República tenha obtido maior visibilidade. O movimento estabeleceu, ainda, conexões importantes com a Maçonaria e com os missionários protestantes, que percorriam o Brasil na tentativa de fixar igrejas evangélicas, além, das íntimas ligações que tinham os seus integrantes, quase todos tocados pelas idéias cientificistas que dominavam o ambiente intelectual da segunda metade do século XIX.

A campanha abolicionista teve várias faces, a começar, ao mesmo tempo, que a propaganda republicana, pelas manifestações estéticas, que revelaram figuras geniais como o poeta Castro Alves, o maestro Carlos Gomes, representativos de uma geração que tomou as ruas, as redações dos jornais, os corredores das faculdades, em defesa da dignidade humana. Depois foram criadas as Sociedades, muitas delas secretas, destinadas a somar esforços em prol da libertação dos escravos.

Em Aracaju foi fundada e instalada à rua de Capela, a Sociedade Libertadora Sergipana, liderada por Francisco José Alves, agregando a colaboração de outras pessoas, como a professora Etelvina Amália de Siqueira. A Sociedade, conhecida como A Cabana do Pai Tomás, numa alusão ao romance de Herriet Becher Stowe, editava o jornal O Libertador, como órgão da causa abolicionista. Francisco José Alves, contudo, não era um partidário da propaganda republicana e chegou mesmo a lamentar o fim da monarquia.

A propaganda republicana ganhou importância em Laranjeiras, nos pequenos jornais, graças a uma somação de fatos favoráveis, a saber: a presença do médico Domingos Guedes Cabral clinicando, e sua substituição por Felisbelo Freire; a pregação dos missionários norte-americanos, presbiterianos, e a conseqüente criação da Igreja protestante, em 1884; a condição de maçons, de alguns dos “rebeldes” listados por Baltazar Góes em sua A República em Sergipe. Ainda que em Estancia, em Vila Nova (Neópolis), em Maruim a República tenha inspirado alguns engajamentos, foi em Laranjeiras, sem dúvida, que o movimento ganhou densidade e liderança, promovendo a organização política para a transição de 1889.

Guedes Cabral tem sido uma unanimidade da crítica, tanto pela posição contestadora na Faculdade de Medicina da Bahia, como pelo seu papel intelectual exercido em Laranjeiras, onde clinicava, em Maruim, onde era orador do Gabinete de Leitura. Foram sete anos de intensa atividade, agitando toda a zona da Cotinguiba com suas idéias livres, que soavam como novidades diante do magistério moral da Igreja católica, presente desde os primeiros tempos da colonização.

Todos os que historiam a propaganda republicana em Sergipe, especialmente em Laranjeiras, afirmam, convictos, a contribuição de Guedes Cabral sem a qual os fatos não teriam os desdobramentos que tiveram. O padre Filadelfo Jônatas de Oliveira, que foi por longo período o vigário de Laranjeiras, atribuía a posição de Guedes Cabral à tuberculose, doença que forçaria seu retorno para a Bahia, em 1882 e sua morte, em janeiro de 1883. Poucas vezes alguém influiu tanto uma geração, quanto o médico baiano em Laranjeiras.

Três pequenos jornais serviram, magistralmente, de veículos propagandísticos: O Horizonte, O Laranjeirense, O Republicano, cada um com seu corpo redatorial, seu papel e sua influência, na marcha batida para mudar os fatos da história. Cada um cumpriu, no seu tempo, fases esseenciais do movimento republicano, de acordo com as condições objetivas existentes em Laranjeiras. Tais jornais, vistos no contexto da imprensa sergipana, se destacam pela coragem dos seus patrocinadores.

Havia uma crítica, nem sempre velada, com relação a certos integrantes do movimento republicano e que tinham contatos e amizades com os senhores escravocratas e monarquistas. No entanto, o valor e o alcance da propaganda retiraram qualquer ilegitimidade que pudesse sublinhar a pregação sincera da geração republicana. Estiveram nos jornais, também, maçons e protestantes, engrossando o caldo propagandístico, ampliando os horizontes do recrutamento social.

Alguns dos republicanos de Laranjeiras eram iniciados da Maçonaria e frequentavam a Loja Cotinguiba, fundada em 10 de novembro de 1872. Firmino José Rodrigues Vieira, por exemplo, engenheiro e um dos expoentes da propaganda republicana em Laranjeiras entrou na Maçonaria em 1873, enquanto José de Siqueira Menezes, engenheiro militar, e Marcelino Jose Jorge, também militar, entraram na mesma Loja em 1881. Outros republicanos se tornaram maçons, declarando liberdade religiosa, o que facilitaria a presença dos missionários protestantes com suas bíblias e seu convencimento.

Na sua História Constitucional da República, Felisbelo Freire atribui a Siqueira Menezes todo o mérito de comandar a Proclamação da República em Sergipe, destituindo o então vice presidente Tomás Cruz, que estava na presidência esperando a chegada do novo presidente nomeado para a Província, Manoel Joaquim de Lemos, e organizar o novo Governo. O engajamento protestante, que pode ser avaliado pelas polêmicas que estão nos jornais e que foram objeto de estudo de Jackson da Silva Lima no seu Estudos Filosóficos, também pode ser representado pela participação direta de Manoel Antonio dos Santos David, representante em Laranjeiras dos missionários norte americanos, ajudando a manter aberta a Igreja e fazer funcionar a Escola Americana, esta exaustivamente estudada por Ester Fraga Vilas Boas Carvalho do Nascimento.

Manoel Curvelo de Mendonça, que era apenas um rapaz de 17 a 18 anos quando participou do movimento republicano em Laranjeiras, publicou um livro – Sergipe Republicano, com o qual amplia, criticamente, o ensaio de Baltazar Góes. Aluno de Baltazar no Liceu Laranjeirense, ouvinte das conferências do Clube Democrata e participante do movimento, desde a propaganda até a fundação do Clube Republicano, Manoel Curvelo de Mendonça recupera o ideal republicano, sem expor a desilusão confessada pelo seu mestre.

Fonte: Pesquise - Pesquisa de Sergipe/InfoNet.
institutotobiasbarreto@infonet.com.br.

Imagens e texto reproduzidos do site:
infonet.com.br/luisantoniobarreto

Palácio Olímpio Campos, em Aracaju

Foto: arquivo Lineu Lins.

Palácio Olímpio Campos, em Aracaju/SE.

História:

Quem conhece Sergipe certamente já ouviu falar da importância histórica, política e cultural do Palácio Olímpio Campos - um dos mais importantes patrimônios do estado. Idealizado na época do Brasil Império, inicialmente, pelo então Presidente de Sergipe, Dr. Salvador Correia de Sá, em 1856, o “Palácio Provincial” seria criado para funcionar como sede do Governo do Estado e residência do governador na capital sergipana, tendo em vista que a mesma já havia sido transferida de São Cristóvão para Aracaju. Este projeto, de autoria dos engenheiros Francisco Pereira da Silva e Sebastião Pirro, não foi aprovado naquela época e, posteriormente, em outras gestões, foram apresentadas novas propostas para a construção do Palácio, mas que também não obtiveram êxito.

Na presidência do Dr. Manuel da Cunha Galvão foi elaborado um novo projeto, também de autoria de Francisco Pereira da Silva, que foi, finalmente, aprovado pelo Governo Imperial. Este projeto sofreu alterações com a construção de um pavimento superior, tornando-se mais adequado às necessidades funcionais da sede do Governo Provincial. No pavimento térreo funcionariam as Secretarias de Governo e no pavimento superior, a sala de despachos e a residência do governador. Essas obras foram iniciadas em 1859 e concluídas em 1863, na presidência do Dr. Joaquim de Mendonça.

Somente em 12 de julho de 1954, através da Lei nº 575, no governo de Arnaldo Garcez, o casarão foi denominado “Palácio Olímpio Campos”, em homenagem ao jornalista, professor e sacerdote Monsenhor Olympio de Souza Campos, cuja personalidade política ganhou destaque em todo território nacional, especialmente como deputado federal, presidente do estado e senador, até meados de 1906 – ano do seu falecimento. Mais de cento e vinte anos após a sua inauguração, em 1985, o Palácio Olímpio Campos foi tombado, através do decreto nº 6.818 de 28 de janeiro, por ser um dos mais significativos monumentos da arquitetura oficial e importante referencial da história política e da cultura sergipanas.

Foto e imagem reproduzidas do site: palacioolimpiocampos.se.gov.br

Isso Não se Ensina.

Isso não se ensina.
Por Lilian Rocha*

Sou do tempo da ditadura. Tempo em que éramos obrigados a desfilar em 7 de Setembro, a participar do hasteamento da bandeira todas as quintas-feiras, de pé, debaixo de um sol causticante de verão, e a assistir às aulas chatíssimas de OSPB (Organização Social e Política Brasileira) e EMC (Educação Moral e Cívica). Até mesmo nossos cadernos, da marca “Companheiro”, traziam na contracapa a letra do Hino Nacional. Enfim, tudo era feito de modo a estimular na gente o amor pela nossa Pátria.

Só que comigo se dava exatamente o contrário. Quanto mais eu era obrigada a marchar, usando gravatas e luvas naquele sol quente, menos amor eu sentia pelo Brasil. Porque ‘patriotismo’, pra mim, era sinônimo, unicamente, de obrigação, desconforto, calor, tonturas e nada mais.

O Brasil também me lembrava Geografia e Geografia, por sua vez, me lembrava uma professora terrível que eu tive. Graças a ela, passei muitas noites em claro, tentando decorar os afluentes da margem esquerda e direita do Rio Amazonas, bem como o nome de todas as serras, bacias, picos, portos e aeroportos do país. Essa professora foi minha durante 5 longos anos e tudo o que eu não consegui aprender de Geografia eu devo, exclusivamente, a ela.

Por isso, nunca me considerei uma filha orgulhosa da minha pátria e confesso que nunca alimentei muito essa história de patriotismo. Não acho que a gente deva amar um lugar só porque nasceu ali. Isso pra mim nunca foi suficiente. É necessário mais. É necessário que o lugar desperte na gente o orgulho de pertencer a ele.

Patriotismo é algo que todo mundo tem, adormecido dentro de si mesmo. Que pode ser despertado subitamente, semelhante àquela emoção espontânea que sentíamos, sempre que víamos Ayrton Senna dar a volta da vitória, empunhando numa das mãos uma bandeirinha de papel, ao som daquela música que virou símbolo dele. Naquele momento, o Brasil era um só. Independente de gostarmos ou não daquele esporte, sentíamos orgulho dele. Orgulho por saber que aquele campeão era um dos nossos. E orgulho do nosso país por ter produzido um filho tão notável...
Patriotismo é aquela emoção que dá quando a gente está longe do país e de repente ouve tocar o nosso hino... O coração dispara, os olhos ficam cheios d´água e lá na garganta aparece aquele nó esquisito, que rouba o pensamento da gente e deixa a gente sem fala...

É muito mais que saudade. É se ‘reconhecer’ parte integrante de um lugar. E isso não se ensina, se desperta.

Foi o que aconteceu ontem comigo, quando entrei para conhecer o ‘Museu da Gente Sergipana’. Sempre gostei de museus, de parar em cada peça exposta, sem pressa, e ler todas aquelas explicações, para depois repeti-las para alguém, com o maior entusiasmo. Adoro ver roupas e objetos pessoais de alguém importante, de ouvir gravações antigas, de ver reconstituído, bem ali na minha frente, o mesmo ambiente que alguém viveu. Minha imaginação corre solta...

De um tempo pra cá, os museus ganharam uma nova concepção e se tornaram mais interativos. Como o Museu da Língua Portuguesa, em SP, de quem me considero a maior fã. Construído numa antiga estação de trem, bem no centro da cidade, o museu tem três andares e mostra a língua portuguesa das maneiras mais inusitadas, menos através de livros. Isso seria muito óbvio e a proposta do museu é exatamente outra: inovação e muita, muita criatividade...

É meu passeio obrigatório sempre que vou a SP. No lugar onde as pessoas se sentavam para esperar o trem, hoje é possível sentar e assistir a história da nossa língua passar pela nossa frente, feito um trem em movimento, mostrando como o português é falado nas mais diversas situações: na música, no futebol, na culinária, nas brincadeiras...
Por isso, qual não foi minha alegria ao saber que o nosso museu daqui seguia a mesma concepção do de lá! Resolvi ir até lá para experimentar fazer turismo, mesmo sem ser turista...

Logo na entrada vi uma escultura de Zé Peixe, um dos mais famosos personagens sergipanos, em sua pose preferida, pronto pra mergulhar no Rio Sergipe e fazer o que sempre fez a sua vida toda: guiar as embarcações. Fiquei feliz pela justa homenagem. Aquele homem pequenino e simples, que só vivia descalço e que tantas vezes vi atravessar a rua para nadar naquele rio, solitariamente, agora virara peça de museu e sua história seria contada e recontada, preservada para sempre.

Depois de Zé Peixe, outra surpresa me aguardava lá dentro: o carrossel de Tobias. Vi os turistas lendo atentamente, procurando entender sua história, mas só quem foi criança em Aracaju, na década de 60, sabe o que significava o carrossel de Tobias. Em vez de ouvir as explicações dadas aos turistas, perguntei baixinho ao ouvido da moça onde conseguiram achar os cavalinhos e o boneco Tobias, revelando pra ela uma intimidade com aquele brinquedo que ela jamais seria capaz de entender...
E enquanto o carrossel girava, muitas lembranças da minha infância também começaram a passar por mim na mesma velocidade, como se estivessem ali todo o tempo, esperando somente que alguém ligasse um botão... Senti uma coisa estranha dentro de mim, que fez meus olhos se encherem d´água...

E assim foi durante toda a visita. Em cada salão, uma surpresa me aguardava, trazendo de volta pedaços da minha infância, brincadeiras que também foram minhas, personagens que fizeram parte da minha história... Cheguei até a entrar num barquinho e percorrer o agreste sergipano... sem dúvida, a aula de geografia mais prazerosa de toda a minha vida!

E à medida que me reconhecia naquele jeito típico de falar, de comer, de me relacionar com as pessoas, fui sentindo a mesma emoção que dá quando estamos longe do país e ouvimos alguém falar a nossa língua...

De súbito, um sentimento de orgulho tomou conta de mim. Orgulho de fazer parte desse país tão rico na diversidade e tão alegre na maneira de contar suas histórias. Orgulho dessa hospitalidade nordestina, pura e genuína, dessa intimidade que temos no tratar alguém, como se todos fizessem parte da mesma família. Orgulho desse estado pequenininho, tão jovem ainda de histórias para contar, mas que soube se vestir com suas melhores roupas para mostrar aos visitantes um pouco da sua alma e do seu espírito.

Orgulho por me “reconhecer” parte daquela história e daquela gente.
Sim, isso não se ensina, se desperta...

*Post de Lilian Rocha, em 10.01.14, na sua página do Facebook.
Foto e texto reproduzidos do Facebook/Fan Page/Lilian Rocha.

Os Desmaios de Emilinha.

"Ontem tive um grande prazer ao ver esta bela foto aqui neste grupo (MTéSERGIPE) e a quantidade de lembranças que ela trouxe à tona. Como essa imagem também me traz muitas recordações, tomei a liberdade de 'roubá-la' para ilustrar, também, as minhas lembranças. Agora sim, lembranças e foto estão dentro da mesma saudade..." (Lilian Rocha).
 ............................................
 Os Desmaios de Emilinha.
Por Lilian Rocha.

“Educandário Brasília”. Era esse o nome da minha primeira escola. Nome comprido, que a gente tinha que escrever diariamente no caderno, antes de todos os deveres. Com aspas e tudo. E depois das aspas, vinha uma vírgula e a data por extenso.
Minha escola ficava na Rua da Frente, bem pertinho da Capitania dos Portos e era dirigida por quatro senhoras, também professoras: D. Alaíde, D. Helena, D. Mili e D. Iolanda.
Talvez elas nem fossem tão senhoras assim naquele tempo, mas quando se tem 7 anos, qualquer pessoa com mais de 15 já é considerada uma senhora. Ainda mais quando se tem cabelo azul! Isso mesmo, cabelo azul! Duas delas, D. Mili e D. Iolanda, tinham cabelos azuis e isso, pra mim, era um dos mistérios mais indecifráveis do universo, pois quando se tem essa idade, a gente nem imagina que existe uma coisa chamada ‘tintura para cabelos’...

Minha farda era uma saia vermelha e branca, plissada, com suspensórios que se cruzavam atrás. E abotoando a blusa branca, uma gravatinha vermelha, feita do mesmo tecido da saia.
Estudávamos pela manhã e à tarde voltávamos para ‘fazer banca’, expressão genuinamente sergipana, que até hoje não sei bem o que significa, etimologicamente falando. Mas sei muito bem o que significava naquele tempo.
‘Fazer banca’ significava almoçar e voltar para o colégio 1 e meia da tarde para fazer os deveres e estudar as lições para o outro dia. Uma solução prática que as mães encontraram para deixar seus filhos em lugar seguro, enquanto trabalhavam. E que até hoje é usada, sob pseudônimos modernos de ‘aula de reforço’, ou ‘turno integral’.
Fazer banca significava ler em voz alta e em grupo uma mesma leitura duas ou três vezes e morrer de vergonha quando a professora passava pela minha fila e me surpreendia cochilando, diante daquela história sem graça, que todo mundo já sabia o final. Nessa hora, ela levantava a voz e eu tomava um susto danado...
A única coisa boa da banca era ganhar uma goiaba todos os dias de Kátia, minha colega que morava numa casa de muro enorme, todo rosa. Até hoje, quando como uma goiaba, sinto o gosto do sorriso amável de Kátia.

Estudei em quase todas as salas e experimentei todas as cores de plástico com as quais forrávamos os livros e cadernos: vermelho, no 1º ano, amarelo no 2º, azul no 3º e verde no quarto. Mudar para outra ‘cor de plástico’, portanto, era tão importante quanto ser promovido num exame de faixa...
Adorava cópias e ditados, mas detestava questões e problemas. Especialmente aqueles que me pediam pra descobrir qual a idade do vovô, se ele tinha o triplo da idade de Joãozinho, que por sua vez, tinha a metade da idade da titia. Que mania mais feia tinha a minha professora, querendo saber a idade de todo mundo!

Na hora do recreio, meus olhos não se desgrudavam da lancheira de Suzana Barreto, pois era a única que trazia, não a tradicional garrafinha plástica com ki-suco, mas uma garrafinha verde, de ‘Guaraná Champagne Antárctica’. E diante dos olhos invejosos de toda aquela plateia, Suzana tirava um abridor da pasta e com uma habilidade impressionante, livrava-se da tampinha. O barulhinho da tampa se abrindo, deixando o gás escapar, era música para meus ouvidos!
Pode parecer uma bobagem, mas refrigerante, na década de 60, era privilégio de poucos! Era uma coisa bastante cara, que só era encontrada em poucas festas de aniversário. O que era servido nas festas daquele tempo era ponche, um suco de uva com pedacinhos de maçã, que me dava um trabalho danado pra beber, pois nunca gostei de maçã...

Também estudei com Martha Bragança, dona dos deveres mais bonitos do colégio. Além de ser a melhor aluna em português e de ter uma letra linda, Marthinha também era muito caprichosa e gostava de fazer, com lápis de cor, todos os traços, acentos e sinais de pontuação de cada dever, coisa que eu achava tão linda que logo tratei de imitar. Até hoje, quando me vê, ela me dá o mesmo sorriso carinhoso de sempre.

Mas afora o guaraná de Suzana e os deveres coloridos de Marthinha, havia uma outra coisa que me fascinava: eram os desmaios de Emilinha.
Emilinha era um pouco mais velha que eu e estudava na turma de Denise, minha irmã. Mas todo mundo conhecia Emilinha. Ou, pelo menos, os desmaios dela, porque quando a gente menos esperava, alguém entrava correndo pra avisar: “Emilinha desmaiou!”
Eu não sei por que ela desmaiava tanto e nem podia imaginar que aquilo pudesse ser uma coisa séria, mas a verdade é que eu achava linda aquela cena e queria porque queria desmaiar igual a ela! E muito melhor do que o desmaio era o que vinha depois. Aquele abrir de olhos sonolento e esquecido, e de súbito, aquela clássica pergunta que eu tanto gostava de ouvir: ‘O que aconteceu?’
Por isso, eu treinava em casa. Afastava um pouco a cama do meu quarto e tentava cair como ela. Suavemente... Mas um desmaio fingido nunca é a mesma coisa. Todo mundo sabe que é fingido e ninguém corre pra ajudar.
Mas com Emilinha era diferente. Ela tinha ‘classe’ para desmaiar.

Muitos e muitos anos depois, eu estava no banco, tentando pagar alguma coisa muito urgente. Era dia de pagamento, o banco estava cheio, cada fila maior que a outra. Não tinham inventado ainda essa maravilha chamada ‘caixa eletrônico’, nem tampouco a lei dos 15 minutos. Todo mortal tinha que enfrentar fila, fosse ele velho ou novo.
Foi aí que me lembrei de Emilinha...
Me encostei na parede e fui revirando os olhos, devagarzinho, como se estivesse perdendo os sentidos. Depois, de olhos fechados, respirei fundo e passei as costas da mão pela testa.
- A senhora está passando mal? – perguntou alguém.
Revirei ainda mais os olhos e fui me arriando pela parede até chegar ao chão. Imediatamente alguém me trouxe um copo de água, outro começou a me abanar, enquanto outros tentavam me reanimar:
- Calma, vai passar, respire fundo...
- Deve ser pressão baixa, a senhora comeu alguma coisa?
- É melhor deixar ela passar na frente...
Ao ouvir aquilo, balancei a cabeça e agradeci, baixinho:
- Não precisa, obrigada, eu já estou melhor, dá pra esperar...
Mas todos que estavam na minha frente reagiram prontamente:
- De jeito nenhum. A senhora não está em condições. Pode passar na frente.
Diante de tantas gentilezas, não tive outra alternativa, senão pagar a conta e sair, agradecendo a todos...
Principalmente... à Emilinha!

(Lilian Rocha - 29.11.12)

quinta-feira, 9 de janeiro de 2014

Na terça-feira foi a Ceia do Natal


Na terça-feira foi a Ceia do Natal

Na quarta- feira providenciou-se a agonia final do peru dormido que chegara à mesa sem pescoço, qual um bólido explodido, sem a coxa esquerda e com um rombo inusitado nas costelas, claudicante com a única coxa a equilibrá-lo no prato, entre bandas de figo em calda e rodelas de kiwi. Foi devidamente comido com um resto de macarrão pegajoso e rodelas de abacaxi fritadas na manteiga, onde se acrescentou leves porções de arroz com passas e algumas lentilhas. Como opções de sobremesa as gordurosas rabanadas da vovó ou o pudim de leite condensado da titia, cuja receita, guardada como um segredo inviolável aparecia descaradamente nos rótulos da Nestlé.

Na quinta foi a vez do resto do pernil de carneiro assado em padaria, cravejado de azeitonas pretas e cravos da índia, coitado, apresentando graves mutilações perpetradas à faca em sua anatomia, o que o deixara com bizarras planitudes e quinas, como se fosse uma caixa de carne bastante artificial com um osso dentro. Foi inteiramente comido com uma rançosa farofa de manteiga quase intocada na ceia da terça, restando-lhe apenas um ignóbil resto de papel laminado nas extremidades do osso a lembrar sua fantasia festiva nos embates natalinos. Comeu-se de sobremesa farelos de Panetone, permitindo-se ás crianças arrancar com as mãos os nacos restantes e a comê-los ferozmente com divertida maleducação.

Na sexta a família mobilizada tomou de assalto à geladeira da vovó e jogou no lixo a bandeja de salpicão azedado e o perigoso stogonof de camarão com cogumelos enormes, que ameaçavam emergir para o cardápio da família.
Preferiram um ovo frito com feijão.

Amaral Cavalcante- 2013

Relato de um neófito digital


Relato de um neófito digital

O pessoal daqui de casa não gostou muito da ideia. Afinal, uma enorme TV de plasma com opção de Facebook na internet instalada na parede frontal à minha cabeceira, ameaçaria o já negligenciado programa de exercícios fisicos, receitado pela medicina para aplacar o doloroso enrigecimento das juntas e outros achaques comuns a essa tal de “melhor idade” que a vida teima em me atribuir, reduzindo o sobe-e-desce cotidiano, da cama para o computador lá em baixo. Com Facebook disponível na cama, entre um cochilo e outro, quem iria me tirar de lá?

Tive que prometer assiduidade a uma Academia contratada há meses e que ainda não vira a cor das minhas meias soquetes, por absoluta ojeriza às conversinhas sem graça exigidas pela sociabilidade em tais recintos , por horror à visão de panturrilhas salientes em senhores de meia idade e pelo incômodo estético que me causam as rígidas bundas de estatuária pré colombiana em senhoras saiticas, adeptas da máxima que oferece a bunda como o que mais interessa à lubricidade nacional. Isto, sem falar no fervoroso odor dos desodorantes caros e perfumadíssimos, incendiados depois de três marombas. Prometi aderir e pretendo cumprir a promessa. Inclusive, comprei hoje um tênis que acende a apaga, para marcar presença luminosa neste meio.

Depois da TVzona devidamente instalada, fomos ao que interessa: fazê-la funcionar. A bicha logo me abrigou a convocar a sapiência digital de parentes e aderentes, cada quem se dizendo mais a par das instruções criptpografadas no exíguo manual cheio de álgebras e letrinhas miúdas que, à primeira vista, me pareceu uma Pedra de Roseta pós-moderna me remetendo aos cafundós do meu remoto aprendizado eletrônico, quando tudo era mais fácil. Sou de um tempo em que só era preciso girar o botão e o rádio falava! A maior dificuldade era esticar de novo o cordão do dial, fazendo-o parar na estação certa ou trocar, de vez em quando, uma válvula queimada. Contei isso aos meus ajudantes, mas eles nem me deram atenção, ocupados na clicagem do “menu”, absortos na tarefa de fazer útil a geringonça comprada. Foi-se o resto do dia neste mister.

Finalmente a imagem apareceu, maravilhosa, trazendo-me a sensação de presenciar um mundo novo, igual à que senti quando, no velho Cine Brasil, em Simão Dias, vi as Bigas de Bem Hur correndo sob o efeito Panavisiom, em Cinemascope, com o fôlego entrecortado de justa emoção e maravilhamento. Agora eu estava diante de um novo milagre da Philips, velha feiticeira tecnológica que eu aprendi a respeitar desde criança.

Fui com gosto aos desenhos animados com o seu exagerado colorido, de Bob Esponja aos Padrinhos Mágicos, do belo Hércules aos infernos de Puro Osso, evitando sempre os noticiários com seus horrores cotidianos, suas barrancas assassinas, suas mentiras políticas para nos encher o nariz de folha, seu apetite voraz pela má notícia. Dei um tempo da realidade explícita para suprir minha necessidade de cores brilhantes e apaziguadoras, naquela tela enorme que o mundo novo me propiciava.

Ainda não consegui acessar o Facebook, mas isto virá. Só falta ajeitar o hay fay daqui de casa. Me aguardem.

Amaral Cavalcante- 06/01/2014

A Volta do Cruzado

 
A volta do Cruzado

Fui ver o Cavalheiro voltar,
aguçando a vista na ameia principal da cidadela.

Honrado pela antevisão do Graal,
ele bebera da morte em cálices profanos,
gota a gota, o fel das suas entranhas

Foi quando o vi chegar
no horizonte, a imagem dele
replicando liturgias romanescas
sobre as asas de um pégaso avião.

O esquife lapidado em lâminas de sol.
como a talhar-lhe a armadura final da cruzada eterna
por Deus e pela pátria.

Vi suas armas depostas, a lança derreada
sobre honras e glórias.
A fronte everdecida, o grito congelado no último comando,
o coração calado a escutar da ruas a eternidade amorosa do seu povo

Cornetas!
Mandem baixar a ponte levadiça.

É o grão senhor que retorna
para fincar seu estandarte no coração da nossa praça principal.

Amaral Cavalcante - janeiro/2014.

Pasmem, Poço Redondo Existe!


Do Blog Ser tão/Sertão.
Poço Redondo/SE. 29/07/2011.

Você conhece Poço Redondo?
Uma visão sobre o município de Poço Redondo através de artigos e crônicas
.............................................
Pasmem, Poço Redondo Existe!
Por Rangel Alves da Costa*

Os mais velhos diziam e todos os relatos históricos confirmam que nas longínquas brenhas do sertão sergipano, no mais escaldante recanto do semi-árido de meu Deus, por entre serras, na vastidão dos mandacarus e xique-xiques, bem nas ribanceiras do Velho Chico, um dia surgiu um andante, depois mais um e mais um, que fixando-se no lugar construíram as primeiras moradias daquele ermo distante, que foi fazenda, vilarejo, povoado e mais tarde cidade. A esse lugar deram o nome de Poço Redondo, como referência a uma grande cacimba existente no leito do riacho Jacaré " que circunda a cidade -, onde os vaqueiros iam saciar a sede dos animais. "Onde vai cumpade?", e o outro respondia: "Vou lá no poço redondo dar água ao gado". E assim ficou: Poço Redondo.

Através da Lei estadual nº 525-A, de 23 de novembro de 1953, Poço Redondo foi desmembrado do município de Porto da Folha e passou à categoria de cidade, sendo termo judiciário da comarca de Gararu. A efetiva instalação do município ocorreu em 6 de fevereiro de 1956, com a posse do prefeito eleito no pleito de 3 de outubro de 1954, Artur Moreira de Sá, e cinco membros da Câmara de Vereadores. Assim, depois de muitas lutas de suas lideranças políticas, a localidade passou a ser regida pela Lei Orgânica dos Municípios e pôde reivindicar dos poderes federais e estaduais as melhorias necessárias para sua gente profundamente sofrida.

Com o passar dos anos e a evolução da municipalidade brasileira, mesmo assim Poço Redondo continuou com "aquele ar de antigamente", mínimo desenvolvimento estrutural e o contínuo sofrimento do seu povo com a seca impiedosa. Não obstante tais aspectos, o município possui características que não podem deixar de ser observadas.

Geograficamente, é o maior município do estado, com 1.212 km²; no seu chão está localizado o ponto mais elevado de Sergipe, que á Serra Negra (Serra da Guia), com 742 m; de sua terra brota a nascente do rio Sergipe, na Serra Negra; é o 11º município sergipano em números populacionais, com 29.879 hab. e o 17º em termos eleitorais, com 16.390 eleitores; conta com o maior número de assentados do MST em Sergipe; foi cenário, em 1975 e 1976, respectivamente, dos cinedocumentários para o Globo Repórter "O Último Dia de Lampião" (de Maurice Capovilla) e "A Mulher no Cangaço" (de Hermano Penna) e do premiado filme "Sargento Getúlio" (em 1985, de Hermano Penna); foi o município nordestino que mais contribuiu com cangaceiros para o bando de Lampião, num total de 23 poço-redondenses, entre homens e mulheres; e foi em suas margens ribeirinhas, na Gruta do Angico, que Lampião e Maria Bonita, juntamente com mais nove cangaceiros, foram massacrados pela volante alagoana em 28 de julho de 1938, pondo fim ao ciclo do cangaço organizado.
Como observado, por mais que autoridades governamentais, estudiosos e pesquisadores, magistrados, jornalistas e todos "aqueles estranhos ao mundo sertanejo" tentem ou queiram menosprezar a terra e o seu povo, verdade é que Poço Redondo possui história, geografia, economia, atratividade turística e, o que é mais importante, dignidade na humildade, dignidade na luta e dignidade no caráter de sua gente.

Alertar sobre isso é uma necessidade imperiosa, vez que, como dito acima, o município quase sempre é esquecido pelas autoridades constituídas e por aqueles que formam a opinião pública. Somente nas tragédias e nas calamidades é que se torna alvo das políticas assistencialistas (no pior sentido da expressão) governamentais ou ganha volumoso e sensacionalista espaço na mídia. Quem não se lembra, por exemplo, do ônibus que incendiou e explodiu na pista que leva ao povoado de Santa Rosa do Ermírio, matando mais de vinte pessoas; da ponte sendo destruída pelas águas do riacho Jacaré, causando mortes ao longo do seu leito; da garotinha da Barra da Onça, bonita e de aspecto triste, da fotografia de Sebastião Salgado; da mãe de família chorando porque não tinha água nem alimentos para dar aos filhos; da farsa montada para mostrar pessoas comendo palma numa dessas estiagens passadas; enfim, da necessidade de mostrar que quanto pior melhor?

Outros fatos podem ser acrescentados para demonstrar o menosprezo e a falta de respeito pelo município e sua gente, fatos que de fininho saem do contexto local e alcançam vertentes muito mais amplas. Basta citar mais uns três ou quatro exemplos: frequentemente os repórteres das televisões afirmam que a Gruta do Angico está localizada no município de Canindé do São Francisco; Poço Redondo é o único município do estado que não possui uma rua sequer com seu nome em Aracaju, e isto é verdade que já foi comprovada pelos Correios; a localidade já sediou três agências bancárias (Banco do Brasil, do Nordeste e do Estado de Sergipe) e atualmente só conta com uma agência do BANESE, e mesmo assim com a negativa perspectiva de fechar suas portas; e, por último, o fato mais recente que se propagou, quando a presidência do Tribunal de Justiça do Estado queria por que queria extinguir a comarca do município (projeto neste sentido chegou a ser enviado ao legislativo estadual) sob a alegação de que o lugar é muito pobre, distante da capital, as carências são visíveis em todos os sentidos e os digníssimos magistrados em início de carreira simplesmente não querem trabalhar lá. Em síntese, o TJSE vê Poço Redondo como um estorvo, como uma ovelha negra que não necessita da tutela judiciária estatal. Discriminação, preconceito, aversão ao sertanejo.

Mas tudo bem, os sertanejos de Poço Redondo são suficientemente fortes para perdoar tudo isso. Eles só querem o que lhes cabe de direito; só almejam possuir o suficiente para viver com dignidade; só querem que os outros não queiram eliminar a felicidade construída no dia-a-dia, molhados de lágrimas, queimados de sol. Ademais, colhendo das palavras do Eclesiastes, os sertanejos sabem que para tudo há um tempo, para cada coisa há um momento debaixo dos céus: há tempo para plantar e tempo para colher; tempo para chorar e tempo para rir; tempo para viver com orgulho de ser tão sertão.

*Poeta e cronista.
e-mail: rangel_adv1@hotmail.com
blograngel-sertao.blogspot.com

Foto e texto reproduzidos do blog: 
blograngelsertaoblogspotcom.jex.com.br

Homenagens pelo Centenário de Ofenísia Soares Freire (1913 - 2007).


Fotos: Victor Ribeiro/ASN.

ASN, Aracaju, 08 de Janeiro de 2014.

Governador descerrou placa e inaugurou busto em homenagem à intelectual sergipana.

A história de Ofenísia Soares Freire inspira e orgulha Sergipe, uma mulher de ideias e ações à frente do seu tempo, mestra, militante política, escritora e acima de tudo um exemplo, que inspirou - e continua inspirando - várias gerações sergipanas, sobretudo aqueles que foram alunos do Colégio Atheneu Sergipense, onde a professora lecionou por muitos anos.

Por reconhecer a importância de Ofenísia Freire, seja como educadora ou como expoente intelectual e político, o Governo do Estado realizou na tarde desta quarta-feira, 8, uma programação voltada a homenagear o centenário da mestra, que, caso estivesse viva, teria completado 100 anos no último dia 6 de dezembro. O governador de Sergipe, Jackson Barreto, idealizador das homenagens, e ex-aluno da professora, disse se sentir honrado em poder prestar tais homenagens à intelectual.

“Quis o destino, com essas coisas que preparam para a vida da gente, que eu fosse governador do Estado no ano do centenário de Ofenísia, um ex-aluno, admirador e amigo daquela velha companheira da Rua de Boquim, nº 457. Ofenísia representa a história das mulheres sergipanas, das guerreiras deste estado, como professora, intelectual e militante política. Era uma mulher tão corajosa, que no processo de redemocratização do Brasil, após a ditadura de Vargas, foi candidata a deputada estadual pelo Partido Comunista Brasileiro. Uma mulher antenada, à frente do seu tempo”, afirmou Jackson, durante a solenidade de descerramento de placa em homenagem a Ofenísia Freire, no Colégio Atheneu, acompanhado de ex e atuais alunos da instituição de ensino, antigos colegas de profissão e familiares da professora, autoridades do Estado e admiradores de Ofenísia.

O governador salientou ainda, que as homenagens não ocorreram na data adequada, 6 de dezembro de 2013, devido ao falecimento de Marcelo Déda à época.

Emocionado, o filho da homenageada, Ivan Freire, mal conseguia expressar por palavras a felicidade em presenciar a dedicação do Estado em reconhecer e homenagear sua mãe. “Quero agradecer esse presente maravilhoso ao comemorarmos o centenário da minha mãe. Meu coração está emocionado, porque tem 7 anos que minha mãe faleceu e vocês não esqueceram dela nesta data e trazem estas belas lembranças em forma de homenagens”.

Após a homenagem no Atheneu, todos se dirigiram à Academia Sergipana de Letras, para a solenidade de inauguração do busto em homenagem à professora. A iniciativa da confecção da placa e busto homenageando a Ofenísia Freire foi do Governo do Estado de Sergipe. A placa foi confeccionada pelo artista Leonardo Leal Santana e mede 70 cm (altura) por 80 cm (largura). Também confeccionado pelo mesmo artista, o busto conta com 65 cm de altura por 40 cm de largura e fica sobre pedestal em granito com 1,05 cm de altura.

Academia Sergipana

Ofenísia Freire ocupou a cadeira nº 16 da Academia Sergipana de Letras. Ana Medina, sucessora da cadeira destacou a postura vanguardista da professora. “A intelectual, a literata, integrante dos conselhos de Educação e Cultura, jornalista, pianista, oradora, acadêmica, mestra de tantas gerações, mulher engajada nos movimentos políticos, qual o melhor poder para distingui-la?”, indagou a acadêmica ao listar as multifacetas de Ofenísia.

Para a secretária de Estado da Cultura, Eloísa Galdino, o que mais lhe tocou, como mulher, ao pesquisar um pouco da biografia da professora Ofenísia, foi o fato da intelectual ter sido uma precursora em um contexto extremamente adverso para as mulheres.

“Ela marcou época exatamente por ser uma mulher que se posicionou no meio dos homens e conseguiu se destacar, só por isso ela já mereceria todas as homenagens. Mas, esta foi uma solicitação direta do governador Jackson Barreto que nos permitiu promover uma verdadeira imersão de parte do Governo na história de uma mulher que tem um significado muito grande para intelectualidade, para a formação política de uma geração de sergipanos. O que vimos aqui, durante esta programação, foi uma aula, na qual as pessoas se emocionaram, e passaram para gente, ao se emocionarem, momentos da história recente e da história política e acadêmica do nosso estado”, explicou a gestora da pasta responsável pela coordenação das homenagens pelo Centenário de Nascimento da professora Ofenísia Freire.

O ex-aluno do Atheneu, e ex-secretário da Educação do município de Nossa Senhora do Socorro, Welligton Mangueira, recordou das orientações da professora aos estudantes do Atheneu, membros do grêmio estudantil e militantes políticos. “A professora Ofenísia sempre foi o orgulho de todas as gerações do Atheneu. Foi ela quem nos apresentou a beleza da filosofia e de ler “O Manifesto Comunista”, de Friedrich Engels e Karl Marx, e muito antes de qualquer um defini-lo como uma obra,também, literária, era já o definia, em 1963”, destacou Mangueira.

A homenageada

Ofenísia Soares Freire nasceu em 06 de dezembro de 1913, em Estância. Mudou-se para Aracaju nos anos 1930 e, a partir daí construiu uma biografia como professora, militante política e intelectual. Lecionou Língua Portuguesa e Literatura em colégios públicos e particulares, a exemplo do Atheneu e do Tobias Barreto.

Casada com Filemon Franco Freire, funcionário público, Diretor do Tesouro do Estado no Governo de Seixas Dória, Ofenísia Freire alternou as atividades do magistério com a militância política. Filiada ao PCB, engajada no processo de redemocratização do País, candidatou-se em 1947 a deputado estadual. Com o PCB proscrito e seus militantes na clandestinidade, Ofenísia Freire voltou-se à cátedra.

À época do movimento militar de 1964, Ofenísia integrava o Conselho Estadual de Educação, quando teve seu mandato extinto e foi afastada do magistério do Atheneu.

Já aposentada e viúva, passou a dedicar-se a atividades intelectuais, tomando parte em conferências e debates e integrando instituições culturais, como a Academia Sergipana de Letras, para a qual foi eleita em 1980, na vaga do poeta Abelardo Romero. Também em 1980 publicou seu livro A Presença feminina em Os Lusíadas (reeditado pela Edise/Segrase em 2013). Foi membro do Conselho Estadual de Cultura, Secretária Municipal de Cultura, na gestão José Carlos Teixeira (1985), e Vice Presidente da Academia Sergipana de Letras. Faleceu em 24 de julho de 2007.

Presenças

Participaram das solenidades os secretários de Estado da Cultura, Eloísa Galdino, da Infraestrutura, Valmor Barbosa, da Educação, Belivaldo Chagas, da Comunicação, Carlos Cauê, do Trabalho, Fábio Mitidieri, do Esporte e Lazer, Maurício Pimentel, da Fazenda, Jeferson Passos, do Meio Ambiente, Genival Nunes, da Segurança Pública, João Eloy e da Controladoria Geral do Estado, Adinelson Alves; os subsecretários de Estado de Articulação com os Municípios, Jorge Araújo, de Articulação com os Movimentos Sociais e Sindicais, Francisco dos Santos e de Desenvolvimento Energético Sustentável, Oliveira Júnior.

Assim como, a deputada estadual, Ana Lúcia; o conselheiro do Tribunal de Contas do Estado, Clóvis Barbosa; a superintendente da Polícia Civil, Catarina Feitosa; os secretários adjuntos de Estado da Segurança Pública, João Batista, e da Comunicação, Sales Neto; os presidentes da Cohidro, Mardoqueu Bodano, da Fundação Aperipê, Luciano Correia e da Academia Sergipana de Letras, José Anderson Nascimento; o diretor do Atheneu, professor Genaldo Lima; familiares, ex-colegas e ex-alunos da professora Ofenísia Freire.

Fotos e texto reproduzidos do site: agencia.se.gov.br