Nestor Piva em companhia do médico Lúcio Prado Dias
REGISTRO de publicação feita em 02/11/2004.
Publicado originalmente no site do Portal INFONET (Blog Luiz A. Barreto), em 2 de novembro de 2004.
Publicado originalmente no site do Portal INFONET (Blog Luiz A. Barreto), em 2 de novembro de 2004.
João Simões e Nestor Piva
Por Luiz Antônio Barreto (Blog Infonet)
Morreram, na semana passada, João Simões dos Reis e Nestor
Piva, dois nomes que deram a Sergipe uma contribuição de alta relevância, como
profissionais da saúde, e como agentes da mobilização intelectual em favor da
Universidade Federal de Sergipe. O primeiro era nascido em Aracaju, filho de
Eunápio Simões dos Reis, irmão de Cícero Simões dos Reis e sobrinho do
bibliófilo e editor Antonio Simões dos Reis, um dos grandes sergipanos com
residência no Rio de Janeiro, onde editava a Revista Euclides, ensinava sobre
editoração de livros e dirigia a Organização Simões, Editora. O segundo era
baiano de nascimento, mas vivia em Sergipe desde o final dos anos de 1950,
incorporando-se ao Hospital das Clínicas Dr. Augusto Leite e aos serviços de
patologia, que era da sua especialidade.
João Simões dos Reis era cirurgião dentista, atendia a
clientela mais abastada de Sergipe. Era o dentista das autoridades, dos ricos,
cobrava caro por seus serviços, mas levava a vantagem de estar atualizado com
técnicas e tecnologias levadas aos congressos, nacionais e internacionais e não
deixava de atender os amigos, ainda que eles não pudessem pagar. Seu
consultório da rua Itabaianinha, entre São Cristovão e Geru, não era de bom aspecto
arquitetônico, não era bonito, não tinha luxo, mas desde as primeiras horas da
manhã assistia ao desfile de figuras importantes, que iam em busca dos pivôs de
ouro e das restaurações com material de primeira qualidade.
A causa da vida de João Simões dos Reis foi a criação de uma
Faculdade de Odontologia. Criou uma sociedade, investiu em imóvel, agregou
parcerias, mas foi vencido pela maioria da área médica que preferia que a
odontologia fosse um curso, dentro da Faculdade de Medicina, a uma escola autônoma.
Uma luta de muitos anos, uma frustração e um certo isolamento, como forma de
recusar a derrota.
Homem ilustrado, curioso com as coisas de Sergipe, resolveu,
já setentão, fazer o curso de jornalismo na UNIT, vibrando na noite da
formatura, com sua alva e grande cabeleira branca. Parecia mais feliz do que
parte da sua turma de jovens. Claro que ele não pretendia exercer o cotidiano
do jornal, onde seus parentes Paulo Costa e Luiz Eduardo Costa sempre deram o
bom espetáculo do texto, para leitores que se transformaram em admiradores. Ele
teve, na sua própria casa, um homem de comunicação – João Simões dos Reis Filho
– que manteve em Aracaju, na década de 1960, uma coluna no jornal e um programa
de rádio, ambos sobre cinema. Simões Filho era parte da geração de José Carlos
Monteiro e Ivan Valença, especialistas na sétima arte, também jornalistas,
também apresentadores de programas de rádio.
Nestor Piva se tornou em Sergipe um profissional da melhor
qualidade, na área difícil da patologia, exercendo longamente a profissão, em
vários lugares, e por último no seu laboratório do Hospital São Lucas. Seu nome
está ligado à história recente da medicina em Sergipe, à melhoria dos
diagnósticos, e ao ensino médico. Como professor ele deu uma enorme e
consciente colaboração ao processo de organização da Universidade Federal de
Sergipe e foi, nos Conselhos da instituição, uma voz competente, lúcida, firme,
corajosa nos encaminhamentos e nas discussões dos assuntos mais importantes,
substantivos. Com um discurso conotado pela autonomia de pensamento, Nestor
Piva não temeu as discordâncias e nem os patrulhamentos, tão freqüentes nos
anos da década de 1970, quando estava instalada na UFS uma Assessoria de
Segurança e Informação, a serviço dos órgãos nacionais de segurança. Os
pronunciamentos e apartes de Nestor Piva, nos debates do Conselho
Universitário, testemunham seus posicionamentos.
Em 1970, durante o Governo tampão de João de Andrade Garcez,
Nestor Piva foi o secretário de Estado da Educação e da Cultura. Fez uma revolução,
formando um grupo de professores, destacando-se Giselda Morais na educação e
Beatriz Góes Dantas na cultura, com o qual implantou ações inovadoras, abrindo
caminho para uma atuação ampla do Governo no setor. O curto tempo não
sedimentou providências que garantisse continuidade, nem permitiu uma avaliação
definitiva do que foi feito. Na parte da cultura é bom lembrar a edição do
livro de Jackson da Silva Lima – História da Literatura Sergipana – volume I, a
implantação do Departamento de Cultura e Patrimônio Histórico e a reorganização
do Arquivo Público do Estado de Sergipe.
João Simões dos Reis e Nestor Piva entraram na política. O
primeiro, no MDB/PMDB, o segundo no PT, o que faz aproximação dos dois, pelo
viés da oposição que abraçaram, de acordo com as circunstâncias do tempo. João
Simões dos Reis foi candidato a deputado federal, enquanto Nestor Piva deveria
ter sido o candidato a prefeito em 1985, mas terminou dando oportunidade a que
Marcelo Déda fosse o candidato e fizesse nome para obter, no ano seguinte, mais
de 32 mil votos para deputado estadual. Na verdade, tanto João Simões, quanto
Piva eram dotados das qualidades da indignação, reagiam a mediocridade
dominante, mas não tinham as “qualidades” para o processo eleitoral, tal qual
se conhece em Sergipe.
Importa dizer, sob o impacto da tristeza e da saudade, que
os dois mortos foram figuras singulares no convívio da sociedade sergipana e
deixaram um legado de coragem, disposição para a luta, exemplos sinceros de
homens de ciência, de cultura, e de política, na melhor acepção do vocábulo.
Homens predestinados, com seus sonhos e decepções, suas crenças e consciência
ideológica, construindo alternativas para vencerem a resistência da mesmice,
como a mostrarem que há jeito para o contencioso acumulado de insatisfações.
João Simões dos Reis e Nestor Piva, aparentemente distintos
em seus labores de muitos anos, terminaram juntos na morte do mesmo dia aziago
para Sergipe e para os sergipanos.
Fonte “Pesquise – Pesquisa de Sergipe/InfoNet”.
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