Foto reproduzida do site: casacivil.se.gov.br
Augusto Maynard
Canhões e trincheiras na Praia Formosa.
Por José Anderson Nascimento*
Na madrugada de 13 de julho de 1924, a cidade do Aracaju era
sacudida por cruento tiroteio, alimentado pelo matraquear das metralhadoras do
28º Batalhão de Caçadores, cuja corporação havia sido sublevada pelo capitão
Eurípedes Esteves de Lima e tenentes Augusto Maynard Gomes, João Soarino de
Melo e Manuel Messias de Mendonça, para apoiar a Revolução Paulista de 1924,
que havia estourado na cidade de São Paulo, a 5 de julho, sob a liderança do
general Isidoro Dias Lopes, major Miguel Costa, João Cabanas e Joaquim Távora,
contra o Presidente da República, Artur da Silva Bernardes. O objetivo desse
movimento de oposição a Bernardes, era pôr fim à oligarquia do Partido
Republicano Paulista e Partido Republicano Mineiro, que impunham sempre em seus
conchavos os presidentes, impedindo assim que se manifestasse livremente o
desejo do povo na escolha do Chefe da Nação.
Crises militares foram uma constante na primeira fase da
República, mas, a partir de 1922, elas ganhariam um novo protagonista: a
oficialidade de baixa patente, de que decorreu a denominação
"Tenentismo". Encarnando as aspirações da classe média urbana, esses
revolucionários pugnavam pela adoção do voto livre e secreto e pela moralização
dos costumes políticos.
O primeiro levante tenentista teve lugar no final do governo
do Presidente Epitácio Pessoa, com a Revolta do Forte de Copacabana.
Enfrentando uma grave crise militar, provocada pela publicação na imprensa de
cartas ofensivas às Forças Armadas, atribuídas ao candidato Artur Bernardes,
Epitácio Pessoa determinou o fechamento do Clube Militar e a prisão do seu
presidente, Hermes da Fonseca. Dois meses depois, a 5 de julho de 1922,
revoltaram-se as guarnições dos fortes do Vigia e de Copacabana, neste último
sob o comando do capitão Euclides Hermes da Fonseca, filho do ex-presidente. A
revolta, contornada em dois dias, não teria maiores conseqüências, não fosse o
episódio dos Dezoito do Forte de Copacabana, quando o tenente Antônio Siqueira
Campos e dezesseis companheiros negaram-se a capitular e marcharam para a
praia, onde receberam a adesão do civil Otávio Correia. Ali, enfrentaram
sozinhos as tropas do governo. No combate, morreram os tenentes Nilton Prado e
Mário Carpenter e o civil Otávio Correia.
A Revolta de 13 de Julho, associada ao 5 de Julho, marca o
inicio do movimento tenentista em Sergipe. Os revoltosos atacaram o Palácio do
Governo, que foi defendido pelo tenente Stanley Fernandes da Silveira. Na luta,
morreu o soldado José Martins de Castro e saíram feridos o cabo Marcílio
Cordeiro Santa Bárbara e o soldado Manuel Inácio Teles. No ataque ao Quartel da
Policia Militar, situado na antiga Rua da Frente, hoje Ivo do Prado, onde
funciona a Secretaria da Educação, morreu o soldado José Rodrigues de Oliveira
e muitos ficaram feridos. O Telégrafo Nacional e a Estação Ferroviária, esta
última, localizada nas proximidades do Mercado Thales Ferraz, foram ocupados
simultaneamente. Recolhiam-se presos ao Quartel do 28º Batalhão de Caçadores,
então, localizado na atual Praça General Valadão, onde, hoje, está edificado o
antigo Hotel Pálace de Aracaju, os oficiais que não aderiram ao movimento, a
começar pelo seu Comandante, Major Jacinto Dias Ribeiro, capitães Augusto
Pereira, Misael Mendonça e Galdino Ferreira Martins e os tenentes Heráclito
d'Ávila Garcez, Antenor Cabral, João Batista de Matos e José Figueiredo Lobo,
filho do ex-Presidente do Estado de Sergipe, José Joaquim Pereira Lobo.
Na mesma madrugada era também preso o Chefe de Polícia, Ciro
Cordeiro de Farias, e a resistência do governo estadual ficava fraca e acéfala,
tendo os revoltosos ocupado todos os pontos estratégicos da capital.
No dia seguinte, o Presidente (Governador) do Estado, Dr.
Maurício Graco Cardoso, era preso e recolhido ao Quartel do 28º BC, juntamente
com alguns auxiliares do primeiro escalão, entre eles o Dr. Hunald Santaflor
Cardoso e o Secretário Gera1 do Governo, Dr. Carlos Alberto Rolla. O governante
ficou incomunicável enquanto durou a Revolta.
Formada a Junta Governativa, logo passou-se à convocação de
reservista e de voluntários. Aracaju estava em pé de guerra. Enorme era o
aparato bélico nas suas ruas e areais.
Preocupados com um possível desembarque de tropas contrárias
pelo mar, os revoltosos cuidaram logo de minar a barra do Rio Sergipe e de
estacionar o canhão SERGIPE, nas brancas areias da Praia Formosa, voltado para
o canal. Ali, também, colocaram mais dois canhões, um denominado de UNIÃO FAZ A
FORÇA e o outro conhecido por 42, mortífera arma alemã da Guerra de 1914. Na
Praia Formosa cavaram várias trincheiras e levantaram barricadas com sacos de
areia.
A resistência à possível reação dos bernardescos não ficou
só em Aracaju. O tenente Maynard deslocou tropas para a Vila do Carmo, atual
Carmopólis, ao Norte, visando conter o Batalhão Hercilio Brito, que marchava
contra as suas posições com mais de 80 homens em armas e muitos cangaceiros
procedentes do Baixo São Francisco. Tropas de Maynard foram ainda enviadas para
São Cristóvão e Itaporanga D'Ájuda, ao Sul. Sabia-se, outrossim, que partia de
Simão Dias uma coluna comandada pelo coronel Pedro Freire de Carvalho,
objetivando defender o Presidente c Estado, em poder dos revoltosos.
Em Salvador, o general Marçal Nonato de Faria era
encarregado pelo Governo Federal de restabelecer a ordem em Sergipe, sufocando
a Revolta e reconduzindo ao Governo o Dr Graco Cardoso. Para essa tarefa contou
com mais de mil homens, procedentes de várias unidades militares, a começar
pelo 20º BC, de Alagoas; 21º BC, de Pernambuco e 22º BC, da Paraíba. Contou,
mais, com soldados das Policias Militares da Bahia e de Alagoas, além do
Batalhão Hercilio Brito.
Na verdade, só os revoltosos do 28º BC cumpriram o
articulado com os seus camaradas paulistas. Em São Paulo, o Governo Federal
reagiu logo, bombardeando a cidade às cegas, atingindo civis e residências. No
final de julho o cornando revolucionário evacuou a cidade, dirigindo-se parte
de suas tropas para o sul onde se juntou às forças do capitão Luís Carlos
Prestes, e parte para Catanduva, onde ainda houve uma resistência por alguns
meses.
As tropas de Prestes haviam surgido no Rio Grande do Sul,
como decorrência da Revolução de 1924. Quando se uniram à Coluna Paulista,
formaram um novo destacamento revolucionário, a Coluna Prestes,' que por quase
três anos percorreu 36.000 km pelo interior do Brasil, através de quase todos
os Estados, divulgando o programa revolucionário do tenentismo e travando uma
série de combates com as forças do governo.
O restabelecimento da ordem legal em Sergipe tornava-se,
contudo, missão espinhosa para o general Marçal Nonato, desde quando te ria que
cumpri-la sem derramamento de sangue e sem negociar condições de rendição com
os revoltosos.
Por outro lado, o capitão Euripedes Esteves de Lima, em nome
da Junta Governativa, anunciava às autoridades e ao povo em geral que os
revoltosos estavam preparados para reagir a qualquer provocação ou afronta.
Dizia, mesmo, que a deposição do Dr. Graco Cardoso não se prendia à política
estadual, absolutamente. Atendia, isso sim, a movimento revolucionário.
O primeiro choque das revoltosos com o Batalhão Hercilio
Brito aconteceu nos arredores de Carmopolis e os ribeirinhos fugiram
desesperados ao primeiro tiro de um velho canhão.
No Rio de janeiro o Congresso Nacional decretava no dia 14
de julho o estado de sitio sobre São Paulo, que se estendia aos Estados de
Sergipe e Bahia.
Respaldado com instrumentos legais, o general Marçal
nato montou a operação para restabelecer a legalidade em
Sergipe. Seria uma campanha conjunta de mar e terra. Para isso contou com
navios da Marinha de Guerra e locomotivas da Ferrovia Leste Brasileiro.
Devido às dificuldades ao desembarque que teriam as tropas
legalistas na Praia Formosa, o executor do sitio em Sergipe preferiu
desembarcá-las nas praias da Estancia.
Com efeito, no dia 24 de julho, por cerca das 10 horas, os
navios Comandante Miranda, Iris, Maraú e Canavieiras singravam as águas do Rio
Real e Piauí, desembarcando as tropas e os equipamentos no Crasto, em Santa
Luzia do Itanhy. Defronte da praia do Mangue Seco, ficando ao largo o
contra-torpedeiro Alagoas.
O cerco aos revoltosos apertava. O general Nonato proclamava
a 25 de julho, na Estancia, que todos os atos praticados pela Junta Governativa
estavam nulos. Adiantava que até o momento do restabelecimento da ordem
constitucional, todas as autoridades deviam-lhe obediência, situação que
somente cessaria com a reposição do Dr. Graco Cardoso no Governo do Estado.
Ajustados os primeiros preparativos, a tropa da Policia da
Bahia foi unir-se a segmento do Exército em Salgado. Daí partiram para
Itaporanga D'Ájuda, onde os revoltosos recuaram para São Cristóvão e, de São
Cristóvão recuaram ainda mais para Aracaju, em que a resistência foi efêmera
fazendo-os capitular. Em Carmópolis a resistência foi maior, em que pese o
porfiado tiroteio que abafou a retaguarda dos tenentes.
A calma somente voltou a reinar em Aracaju a 3 de agosto.
Revoltosos eram capturados e levados ao Quartel do 28º Batalhão de Caçadores,
outros entregavam-se voluntariamente. O tenente Augusto Maynard, auxiliado pelo
amigo Brasiliano de Jesus, conseguiu fugir ao cerco e bateu-se em São Paulo,
sendo preso e conduzido à ilha da Trindade, localizada a 1.150 Km a leste do
Estado do Espirito Santo, que se havia transformado em prisão militar. Mais de
500 pessoas foram indiciadas em processos criminais, porém os ideais de
liberdade permaneceram vivos entre os sergipanos.
Com Maynard, nascia em Sergipe a liderança na luta contra a
casagrande e a cana-de-açúcar, na expressão do Professor Artur Fortes.
O coroamento, porém, do movimento tenentista em Sergipe,
deu-se com a Revolução de 30 e, principalmente com a nomeação do capitão
Augusto Maynard para Interventor Federal no Estado.
E, em sua homenagem, a Praia Formosa transformava-se em
"Praia 13 de Julho", pelo Ato nº 11, do Intendente Municipal Camilo
Calazans, publicado no Diário Oficial de 28 de novembro de 1930, em que Augusto
Maynard Gomes foi reconhecido como o grande líder militar do levante de 13 de
Julho de 1924.
Fonte: JOSÉ ANDERSON NASCIMENTO é ocupante da Cadeira nº 20
da Academia Sergipana de Letras.
Texto reproduzido do site: clicsergipe.com.br/sergipevultos
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