quarta-feira, 30 de abril de 2014

A rua vista da insônia

A rua vista da insônia.

A insônia me leva a esconderijos de onde xereto a vida nos escaninhos da casa.
O cotidiano vai se acomodando pelos cantos
para que a noite atue os seus fantásticos elencos.

No lusco fusco da varanda monto guarda aos meus tesouros:
nesga de sanidade mental guardada no velho baú de palavras inconsúteis,
duas ou três metáforas reumáticas
e a fotografia de algum sorriso atônito
amarelando entre mágoas.

O chinelo faz gemer os tabuados,
a casa estrala em tremores que vão do rodapé à cumeeira.
É a noite inventando medos, ruidosa

O vizinho tosse a mulher ri o filho choraminga a empregada geme no quartinho dos fundos enquanto o pai se masturba no quartinho ao lado.
Uma gata mia entrecortando o cio e logo
o gatão da vizinha espreita a rapariga chorosa no muro baldio.
Vai dar certo!

Na rua uma ratazana frinfa o nariz no ar e dá cinquenta e quatro corridinhas para chegar à lata de lixo,
onde uma multidão de baratas faz a festa.
Um lava-cu solitário sobrevoa a sarjeta e pousa elegante na poça,
roçando a extremidade do cu na poça plácida
e um sariguê, roendo cascas de velhos e dourados pomos, de vez em quando me olha com ar concupiscente.

O carro corta a mortalha da noite chispando no asfalto
e traz, voando atrás de si, em poeira e ventania,
o lixo das ruas despertas
Cascas de amendoim, pontas de cigarro. latinhas amassadas, filipetas de shows imperdíveis, endereços de amails revelados, miçangas perdidas no frege do amor entre as crianças
e muitos baratões mortos voando em festa,
redivivos no levante dos pneus. (Eus)

O dia começou de novo com a sua claridade impune.

Amaral Cavalcante.

Postagem originária da página do Facebook/MTéSERGIPE.

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