sexta-feira, 21 de abril de 2017

Zé Peixe, o Tritão Sergipano







Publicado originalmente no site sereismo.com, em 25 de janeiro de 2017.

Zé Peixe, o Tritão Sergipano. 

Quem é Sereia levanta a mão! Bate o cabelo, balança a cauda, sacode as conchinhas… E quem é Tritão? Se mostra também, porque não?!

Em novembro de 2016 mostramos aqui no Sereismo que existem diversos tritões espalhados pelo Oceano do Brasil e do Mundo, todos belíssimos com as suas caudas incríveis, estilos de vida e personalidade única.

O homem também tem todo o direito de declarar o seu amor ao mar e revelar a sua Alma de Tritão para o mundo. Porque ser feliz é a melhor maneira de encarar os desafios da vida. Graças a Poseidon, a força de nosso cardume só aumenta, e a cada dia que passa, podemos expor livremente a nossas caudas ao Sol por todo o litoral do continente.

E vocês sabiam que no Brasil também existiu um incrível Tritão que amava o Mar? Seu nome era José Martins Ribeiro Nunes, nascido no Sergipe no dia 05 de Janeiro de 1927. Ele era um Tritão com pernas, nas horas em que não estava na água…

Cresceu em uma casa as margens do Rio Sergipe na cidade de Aracaju. Com a ajuda dos seus pais, aprendeu a nadar ainda criança e aos onze anos já era um exímio nadador. José adorava se aventurar nas águas – uma de suas travessuras favoritas era atravessar o rio a nado para comer caju das árvores localizadas na margem oposta. Enquanto os seus colegas iam se divertir na praia do Atalaia e usavam barcos para chegar até o destino, o menino já despertava a sua alma de Tritão e optava chegar até a praia nadando.

A sua casa estava localizada bem próximo a Capitania dos Portos. Em um dia radiante, um comandante de uma das embarcações notou a incrível destreza do pequeno José Martins nas águas e, impressionado ao conhece-lo, o apelidou de Zé Peixe. E este apelido maravilhoso pegou!

Zé era o terceiro filho no total de seis crianças. E entre os seus irmãos também tinha uma Sereia, a Rita (uma coincidência incrível, pois é o mesmo nome da personagem sereia de Isis Valverde na novela A Força do Querer). A Sereia Rita também ganhou o “sobrenome” Peixe, afinal ela sempre acompanhava o irmão em suas aventuras aquáticas no Rio, mesmo durante a noite. Mas seus pais não achavam que este era um comportamento adequado para uma menina…

Como castigo, Ritinha tinha suas roupas de banho escondidas, mas isto não  adiantava  muita coisa. A Sereia e o Irmão Tritão nadavam com o uniforme da escola e, quando chegavam em casa, arrumavam um jeito de deixar as roupas secarem escondidas em algum lugar no quintal dos fundos. Coisas de crianças livres que interagiam com a natureza de forma plena!

Zé Peixe, além de nadar, adorava ir à praia e ficar observando o fluxo dos barcos da região. Gostava de desenhar navios e tinha um imenso prazer em informar aos Capitães que chegavam no Porto sobre a mudança nos bancos de areia do Rio Sergipe.

Os anos se passaram e o Tritão continuou vivendo em sua região. Completou o Segundo Grau e, ao completar vinte anos, passou a trabalhar para a Marinha através de um concurso, exercendo uma função conhecida como Prático do Estado na Capitania dos Portos de Sergipe. Na atuação, o Prático (ou Praticagem) é o profissional responsável por orientar os navegantes que precisam desembarcar mercadorias em Portos do Litoral.

Para auxiliar o Capitão, o Prático indica o melhor caminho para que o navio chegue em seu destino. E para isso, o profissional precisa estar sempre atualizado sobre informações geográficas e climáticas do local. Além disso, o Prático também deve se preocupar com a segurança dos tripulantes, embarcações, patrimônio público e também proteger o meio ambiente marinho local – atitude que as Sereias e Tritões conhecem bem!

Por conhecer detalhadamente a região onde estava localizada a Capitania dos Portos, logo Zé Peixe se destacou em seu ofício. O Tritão conhecia detalhes como profundidade, correnteza, mudança de ventos e todas  as suas características gerais. O seu mágico conhecimento contribuiu de forma exemplar para a movimentação na Barra do Sergipe, que era conhecido como uma das “piores” entradas portuárias do país.

Zé Peixe atuava como excelente guia, mas algo mágico o diferenciava dos demais profissionais. Ele exercia o seu ofício sempre a nado!

Quando um Capitão precisava de seu auxílio para sair do porto e chegar até a entrada do Oceano, Zé subia no navio, mostrava o melhor caminho a ser navegado e, quando chegava no Mar em uma altura em que o navio pudesse seguir o seu rumo, o incrível Zé Peixe amarrava os seus documentos na bermuda e em um ato de coragem admirável, saltava nas águas do parapeito do navio em uma altura de 17 metros (o equivalente a um prédio de 5 andares) e nadava 10km durante 2 horas até a praia.
  
Quando chegava na areia, retomava a sua forma humana  e percorria a pé mais 10km até a sede da Capitania. Existiam situações que, sabendo que alguma embarcação estava com dificuldade de chegar até a entrada do canal devido a fortes ventos ou mudanças de marés, Zé nadava utilizando como auxílio uma prancha de body boarder até uma boia que ficava localizada a 12km da praia. Lá ele subia na boia e aguardava sentado o navio aparecer no horizonte. Por vezes a espera atravessava a noite ou até mesmo durante um dia inteiro de mau tempo.

Imagine ficar sentado na superfície da água, com a maré agitada, céu acinzentado ou na escuridão da noite sozinho acompanhado pelo som das águas… Só um Ser do Mar consegue esta façanha!

Houve uma situação em que o Tritão quase foi impedido de pular. Um Comandante Russo que não sabia de seu modo diferente de exercer o seu ofício, acreditava que aquela atitude era um momento de loucura.

Zé Peixe realizou diversas façanhas que lhe renderam importantes homenagens e condecorações. Aos 25 anos, Zé estava orientando a embarcação a vela Iole Potiguar para fora da Barra. O barco virou e arremessou os três velejadores no mar revolto. O Tritão conseguiu levar os três tripulantes a salvo para a praia, e neste feito teve a ajuda da irmã Sereia Rita. Por este ato, Zé recebeu uma medalha em ouro de Honra ao Mérito do Rio Grande do Norte.

Em outra ocasião, um navio da Petrobras que saía de uma plataforma pegou fogo. Zé, então, adentrou na embarcação em chamas e orientou o navegante a conduzir o veículo até um ponto seguro, onde todos a bordo pudessem saltar no mar e nadar em segurança até a praia.

Zé Peixe recebeu a Medalha Almirante Tamandaré em homenagem aos anos de dedicação e fortalecimento das tradições da marinha do Brasil. Recebeu também a Medalha de Ordem ao Mérito de Serigy, a mais alta condecoração do município de Aracaju. Além disso, foi eleito o cidadão Sergipano do séc. XX e possui estátuas em sua homenagem em pontos diferentes da sua cidade natal.

Ele também conduziu a tocha dos Jogos Pan Americanos de 2007 em um cortejo de barco pelo Rio Sergipe, saiu em diversas reportagens em telejornais, jornais e revistas nacionais e internacionais.

Zé Peixe atuou como Prático até avançada idade e, em 2009, aos 82 anos, solicitou o seu afastamento da Marinha em definitivo.

Com o tempo, passou a sofrer os sintomas do Mal de Alzheimer e teve de se afastar do mar. Faleceu aos 85 anos no dia 26 de abril de 2012, vítima de insuficiência respiratória. Se estivesse vivo, Zé Peixe teria completado 90 anos este mês.

Para finalizar, além de todas as suas incríveis e admiráveis façanhas, o Zé Peixe tinha um estilo de vida bem diferente:

Na parte da manhã tomava café e comia pães, e ao longo dia só se alimentava com frutas;
É incrível, mas ele não bebia água!
Não se banhava com “água doce” desde a infância, só tomava banho de água salgada pois ele só vivia no mar;
Apesar destes hábitos, gostava de manter os cabelos e barba sempre bem cortados;
Não fumava e nem consumia bebida alcoólica;
Dormia às 20h da noite e acordava sempre às 6h da manhã;
Andava descalço todo o tempo e só calçava os sapatos quando ia para a Missa;
Zé Peixe era o único que tinha autorização para circular sem farda nas dependências da Marinha;
Sua locomoção em terra era feita somente a pé ou com a sua bicicleta;
Morou por toda a sua vida na mesma casa simples, na margem do rio Sergipe;
Em sua casa guardava diversas miniaturas de embarcações, e pelas paredes colecionava diversos desenhos de navios de todos os tipos, em sua maioria desenhados pelo próprio Tritão.
Espero que tenham gostado desta história e que, de alguma forma, ela te inspire a viver perto do mar. E que todos nós, em algum momento de nossas vidas, tenhamos a chance de interagir de forma saudável, segura e plena com o universo marinho.

Fiquem com este vídeo onde é  possível ver um pouco de como era o Incrível Tritão Sergipano…

Vídeo do canal do YouTube: Fernando Penteado.
--------------------------------------------
Texto e imagens reproduzidos do site: sereismo.com

Nenhum comentário:

Postar um comentário