Fotos: Marina Fontenele/G1.
Publicado originalmente no site G1 SE, em 29/10/2014.
‘Bar dos Mortos’ reúne santinhos de finados e vira local de
homenagens.
No interior de Sergipe, a dor da morte dá lugar à leveza das
lembranças.
Casal que administra o bar reza e acende velas no Dia de
Finados.
Marina Fontenele
Do G1 SE.
Para muita gente o dia 2 de novembro é a data para recordar
das pessoas que já se foram, mas no município de Itabaiana (SE) a dor da morte
dá lugar à leveza das lembranças dos bons momentos vividos. No Bar São
Cristóvão, popularmente conhecido como ‘Bar dos Mortos’, aqueles que já viveram
são homenageados a qualquer hora do dia em meio a uma conversa ou até mesmo
entre um gole e outro de uma bebida. No local, quadros armazenam fotos de
‘santinhos’ da missa do 7º dia de morte.
A coleção inusitada de Cristóvão Pereira da Silva, de 51
anos, começou em 1998 e já soma mais de 1,3 mil santinhos de finados, ele parou
de contar porque disse que não dá sorte. “Quando meu primo morreu coloquei uma
foto dele aqui para lembrar e desde então, dia após dia, chegam novas fotos. O
pessoal gostou tanto da ideia que chegam a colocar os santinhos por debaixo da
porta já quando volta da missa. Tem gente que passa aqui para conferir as
‘novidades’, acaba funcionando como um mural informativo de óbitos, um
verdadeiro obituário”, afirma Cristóvão.
A esposa do comerciante, Lindinalva Batista, de 59 anos, foi
a primeira a identificar o potencial comercial do que acabou acontecendo no
estabelecimento. “Um rapaz chegou aqui e viu a foto do amigo que ele nem sabia
que tinha morrido, pediu uma cerveja e tomou. Depois ele olhou de novo para o
quadro, chorou novamente e pediu mais uma garrafa. Daí que eu vi que isso
poderia dar negócio ao invés de afastar os clientes”, conta.
No início, o receio era que a coleção de santinhos pudesse
afastar os frequentadores do até então Bar São Cristóvão. “Eu disse a ele para
tirar as fotos daqui porque isso dá medo em acordar de noite e ver foto de
morto. Ele disse que não poderia jogar fora o que o pessoal traz e essa é uma
forma de homenagear as pessoas que já morreram”, destaca Lindinalva.
O comerciante Adenilson Francisco de Jesus vai quatro vezes
ao dia ao Bar dos Mortos, pois é caminho para o trabalho, o ex-caminhoneiro
deixou a antiga profissão com medo dos perigos da estrada. “Já perdi muitos
amigos na estrada, às vezes me sento aqui no bar, bebo uma dose e lembro com
saudade dos companheiros que já se foram”, revela.
No Dia de Finados o ‘Bar dos Mortos’ não abre. Neste dia o
casal que toma conta do local dedica um tempo especial para rezar por todos
aqueles que têm suas fotos nos murais. “A gente reza e acende velas para todo
mundo que está aqui no nosso bar e também para quem não está aqui. Aqui no bar
eu tenho a foto do meu pai, do meu filho, do meu cunhado. A gente sente pelas
pessoas que morreram, mas nós vamos morrer também então não adianta ficar
triste”, diz Lindinalva.
Com amor e bom-humor Cristóvão e Lindinalva levam a vida,
discussão mesmo só quando tocam no assunto para quem vai primeiro para o mural.
“Eu já disse a ela que ela vai primeiro, mas ela é teimosa e até já escolheu a
foto para o meu santinho”, diverte-se. O casal encara a morte como uma passagem
da vida para um lugar de paz.
Foto e texto reproduzidos do site: g1.globo.com/se/sergipe
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