quarta-feira, 4 de dezembro de 2013

Homenagem de Lilian Rocha a Marcelo Déda


Por Um Minuto.
Lilian Rocha - 02.12.13.

Uma das coisas que aprendi com meu pai é que a gente “só não gosta do que não entende”. Acho que é por isso que não gosto de política. Porque não entendo.

Sou uma das filhas da ditadura, época em que a maioria dos jovens vivia alienada, sem saber o que se passava no cenário político. Eu era tão alienada que só fui descobrir que estava na ditadura quando ela acabou.

Mas no meio desse meu ‘analfabetismo político’, alguns fatos me chamaram à atenção, como por exemplo, a campanha das ‘Diretas Já’, em 1984, encabeçada por Dante de Oliveira. Lembro que eu acompanhei tudo pela TV, torcendo em silêncio para que o povo ganhasse de volta o direito de escolher o presidente. É claro que só fiquei sabendo que a gente não tinha esse direito naquela época... Mas não importa. Fui contagiada pelo entusiasmo do povo e fiquei muito triste naquele 25 de abril, quando a emenda proposta por Dante não ganhou.

Em 1985, outra pessoa também haveria de me chamar à atenção, no meio de todos aqueles candidatos que disputavam ferrenhamente um pouquinho mais de espaço no horário político. Era um rapaz de vinte e poucos anos, completamente desconhecido pra mim, que se lançava como candidato a prefeito de Aracaju. Uma ousadia, naturalmente. Primeiro, porque era desconhecido; segundo, porque não era parente de nenhum político conhecido; terceiro, porque era filiado ao PT, um partido pequenininho e muito mal visto pela maioria dos sergipanos; e quarto, porque ele só tinha direito a um minuto de propaganda.

Ora, o que é possível alguém fazer em 1 minuto? Como é possível dizer tudo o que se quer em um minuto?

E enquanto todo mundo se perguntava a mesma coisa, o rapaz aparecia na tela, com apenas uma bandeira como cenário, e expunha suas ideias, de forma clara e objetiva, usando o seu mísero um minuto. Seu nome era Marcelo Deda, mas pra não perder alguns segundos preciosos do seu único minuto, ele se deixou conhecer apenas por ‘Deda’.

Nem me lembro dos outros candidatos que disputaram a prefeitura nessa época, pois nunca morri de amores por discursos políticos, mas o certo é que eu gostava de esperar a vez dele, só pra ver o que ele conseguiria dizer em um minuto.

Gosto da palavra, seja ela falada, escrita ou cantada. E gosto de quem sabe articular bem as palavras, de quem sabe usar as palavras certas nas horas certas. Por isso gosto tanto de publicidade. Acho fantástico conseguir traduzir, em apenas uma frase, o resumo de toda uma campanha publicitária. Isso é uma arte e como toda arte, são poucos os que têm essa capacidade.

Deda era um desses artistas da palavra. Sem recursos para uma campanha milionária e membro de um partido totalmente desacreditado, ele só podia contar com as únicas coisas que possuía: o dom da palavra e a determinação. E foi exatamente nisso que ele investiu...

Escolheu cuidadosamente suas palavras e emprestou a elas sua força e determinação para contagiar as pessoas que o ouviam, pois de nada adianta uma palavra bonita se ela não tem vida. Para convencer alguém é preciso, antes de tudo, ‘estar convencido’. E ele acreditava no que dizia.

Deda não venceu a campanha naquele ano, mas tornou-se conhecido no cenário político, justamente por ter feito milagres com seu único minuto.

O sucesso não tardou a aparecer. Tornou-se deputado estadual, federal, prefeito e governador do estado.
Não acompanhei sua carreira política, pois esse continua sendo um dos assuntos que eu não entendo, mas do pouco que vi, eu percebi que ele continuou do mesmo jeito como quando começou. Sempre apressado, falando com objetividade, como se só tivesse ainda, um único minuto.

Seu pequeno partido tornou-se grande e respeitado e como tantos outros, também enfrentou crises e escândalos. No meio das crises, vi muita gente abandonar o barco e mudar de partido. Mas ele continuou ali, defendendo sua ideologia, acreditando no que dizia. Era um homem, acima de tudo, coerente.

Ontem, quando o cortejo fúnebre passou pela minha janela, levando o seu corpo para ser velado no Palácio do Governo, relembrei de toda a sua trajetória política e finalmente entendi por que ele tinha tanta pressa...
E sozinha, fiz o meu minuto de silêncio, em homenagem àquele que, em um minuto, tornou-se marcante na minha vida...

Texto e foto reproduzidos do Facebook/Fan Page/Lilian Rocha.

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