Publicado originalmente pelo site G1/Globo Reporter, em
28/11/2014.
Capital sergipana da cerâmica constrói em casa a tradição da
cidade
Janelas, calçadas, tudo vira vitrine para o negócio dos
artesãos em Santana do São Francisco. Famílias inteiras atuam nas linhas de
produção caseiras.
Grandeza a perder de vista. O rio que leva o nome de um
santo, faz milagre por onde correm suas águas. É o sustento de milhares de
pessoas.
O Velho Chico sabe ser generoso com os ribeirinhos. Em
tempos de cheia, o rio vai além das margens e forma lagoas. E foi assim, ao
sabor das marés que nasceu a vocação de Santana do São Francisco. Lá, 70% dos
moradores construíram em casa a tradição da cidade.
Vem do barro extraído das margens do rio o segredo do
sucesso do pequeno município de 8 mil moradores. Nas ruas é fácil perceber
porque a cidade e considerada a capital sergipana da cerâmica. As janelas as
calçadas, tudo vira vitrine para o negócio dos artesãos, e é um trabalho que
começa em casa e não vai muito longe não, continua na região.
Globo Repórter: Seu Antônio, seu negócio deu tão certo como
o de muita gente aqui que o senhor teve que ampliar a sua casa?
Antônio Ramos, artesão: Comecei pequenininho e deu certo com
a minha família, hoje está grande.
Globo Repórter: Seu Antônio, é peça demais, não para não?
Antônio Ramos: Aqui não para, não para não, é fazendo o
forno tá lá, já tá secando as peças no forno para amanhã entregar as peças e
fazendo mais, não pode parar, tem que continuar e eu quero que aumente.
Na linha de produção a família inteira. Filhos, genros,
noras. Aos 65 anos, Seu Antônio é quem toma as rédeas do negócio. Hoje está
aposentado, ele já foi agricultor, minerador, trabalhou na construção civil mas
sempre acabava voltando para o artesanato. A chance de trabalhar em casa, ele
nunca largou.
Globo Repórter: E é bom ser patrão de você mesmo?
Antônio Ramos: É bom demais.
Troca da enxada pelo trabalho em casa.
Histórias assim são comuns em Santana do São Francisco.
Em um piscar de olhos, a habilidade e o talento dão forma a
peças pelas mãos de Capilé. No Nordeste, Capilé quer dizer menino curioso,
destemido. O apelido que Wilson ganhou na infância, define bem o espirito desse
artesão.
“E com muita persistência, porque eu fui sempre uma pessoa
assim, persistente, aí eu consegui aprender a fazer peças pequenas, aí dali por
diante eu fui tentando, tentando e conseguia uma, caia duas e não parava”, diz
o artesão Wilson de Carvalho, o "Capilé".
Com planejamento, organização, as peças do Capilé ganharam
um tamanho que nem ele imaginava que seria capaz de fazer. Como um dos muitos
presépios que o Capilé confecciona. Os reis magos Belchior, Baltazar e Gaspar.
Tradição católica retratada em tamanho gigante.
Há 15 anos ele trocou a enxada pelo trabalho em casa.
Cansado da dependência da chuva e do sol, deixou para trás a roça de milho.
Agora depende só dele.
Globo Repórter: Você não se arrepende de jeito nenhum de ter
abandonado a lavoura?
Wilson de Carvalho, artesão: Deus me livre. Para mim foi
muito importante porque aqui agora estou aqui tranquilo.
A pausa nas tarefas quem determina é Dona Fátima, a esposa.
Morar em frente ao trabalho é só vantagem.
“Não tem melhor não, não tem melhor.”, afirma Capilé.
Regra cumprida à risca para o trabalho render.
Mas Dona Fátima não fica só nas tarefas de casa. Ela é
responsável pela pintura das peças.
“Uma emoção de ver uma peça pintada pelas minhas mãos e o
povo quando chega, gosta e compra”, conta Maria de Fátima de Carvalho, artesã.
Para o trabalho render, Capilé tem uma regra cumprida à
risca;
“Planejamento. É a alma do negócio, se planejar. Todo o seu
tostãozinho que arrecadar, que ganhar, planeje ele, pague suas coisinhas e
deixe sempre uma reserva”, revela Capilé.
Assim, ele fez um pé de meia, e que pé de meia.
“Carro não comprei, porque eu não tenho muita vontade de
comprar carro não, mas eu graças a Deus tenho minha casa própria, tenho outra
casa ali, tenho outra casa que mora meu filho”, explica Capilé.
Conforto para família e realização pessoal. Foi o que Capilé
conseguiu trabalhando em casa e aos 50 anos, o menino travesso nem pensa em
parar.
Wilson de Carvalho, artesão: Eu quero que o pessoal me
reconheça com um cidadão ribeirinho, aqui de Santana do São Francisco.
Globo Repórter: E feliz no que faz?
Wilson de Carvalho, artesão: Com certeza!
Texto e imagem reproduzidos do site:
g1.globo.com/globo-reporter
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