Publicado originalmente no site Lagarto Como Eu Vejo, em 3 de junho de 2019
Em Estância, soltura de fogos deve respeitar determinações
judiciais
Moradores cobram que guerras de espada e busca-pé sejam
feitas em local apropriado
Um dos quatro elementos da natureza, o fogo foi a primeira
fonte de energia descoberta e controlada de forma consciente pelo homem; e com
o decorrer da história, passou a ser utilizado pela sociedade de diferentes
maneiras. Causa medo e apreensão em muita gente, e, ao mesmo tempo, pode
refletir uma beleza de encher os olhos, sendo o protagonista de diversos
espetáculos culturais e expressões religiosas ou folclóricas.
Em Sergipe, no município de Estância, região Sul do Estado,
por exemplo, o fogo reina absoluto durante o período mais importante do ano: as
festas juninas. Por lá, o forró, as comidas típicas, as apresentações de
quadrilha e outros folguedos característicos do período, dividem os holofotes
com uma tradição que mistura o colorido do São João ao brilho reluzente do
fogo, com uma boa dose de coragem e, sem dúvida alguma, um tempo considerável
de treino e técnica para quem participa.
São as chamadas “guerras de espada”, que em nada se parecem
com os conflitos sangrentos que marcaram a história de vários países pelo
mundo. Por lá, tudo não passa de uma brincadeira – levada muito a sério –, onde
homens e mulheres duelam pelas ruas da cidade, munidos de fogos de artifício
característicos das festas juninas, a própria espada e o busca-pé, por exemplo.
O problema é que, assim como as guerras reais, nem todo mundo respeita as
regras, e o que era para ser a continuidade de uma expressão popular, acaba se
tornando tormento na vida de alguns.
Foi o que aconteceu aos moradores da Rua Leopoldo Amaral,
conhecida como Rua do Triunfo. Cansados das paredes e fachadas danificadas,
telhados quebrados, barulho e, em alguns casos, problemas de saúde causados
pela fumaça dos fogos, um grupo de 36 pessoas se reuniu e moveu uma ação no Ministério
Público – que foi favorável aos moradores – pedindo providências para o excesso
de queima de busca-pé e espada em um trecho que mede menos de 100 metros de
extensão, como explica o morador, José Cruz, que representa os vizinhos.
“Como o trecho em questão além de curto é estreito, quem
reside nele sofria demais as consequências dessa queima de fogos que vinha
ocorrendo de forma desordenada. Temos crianças e idosos, pessoas alérgicas que
residem nessa região e ficavam ainda mais doentes por causa da fumaça. Sem
falar no prejuízo na estrutura das casas”, desabafa. O estanciano conta que
houve muita polêmica por causa do processo. Gente que quis acusar o grupo de
querer “acabar com o São João de Estância”.
“Um absurdo, pois a festa junina com todos os seus itens, é
uma tradição que já tem mais de um século. Agora convém frisar que a
arquitetura do município mudou e os tempos são outros. O São João daqui é uma
bela festa, mas está faltando ordem e organização”, opina. O morador lembra,
ainda, que existe um decreto municipal que proíbe a queima de busca-pés e
espadas nas ruas de Estância. “Apesar de não ser cumprida a determinação”,
lamenta.
O decreto a que ele se refere é um Termo de Ajustamento de
Conduta (TAC) assinado pela então gestão municipal, em 2013, determinando que
no dia 13 de junho, Dia de Santo Antônio, a soltura de fogos de grande porte,
como os em questão, somente poderá ser feita na Avenida Getúlio Vargas,
popularmente conhecida por “Rua Nova”. Já nos dias 23 e 24 de junho, véspera e
Dia de São João, o local indicado para a prática já é conhecido pelos
participantes da tradição, uma região onde tradicionalmente ocorrem as guerras.
O Termo de Ajuste define, também, que nos demais dias do mês
de junho a soltura de fogos só pode ser realizada na área do “Forródromo”,
local protegido por telas e apropriado para receber a manifestação sem causar
transtorno ou perigo para a população em geral.
Desdobramento
Após o episódio envolvendo os moradores da Rua Leopoldo
Amaral, José Cruz revela que várias pessoas procuraram os representantes da
ação em busca de informações. “Pelo mesmo motivo. Apesar de serem a favor da
tradição, não estão suportando mais o vandalismo provocado por quem solta os
busca-pés sem obedecer às regras já impostas”, completa.
Na próxima véspera da São João, o Forródromo de Estância
completará 25 anos, um espaço que comporta shows, corrida de barco e queima de
fogos. “Mas alguns preferem continuar soltando nas ruas. No mês de junho tem
pessoas que não saem às ruas com medo de fogos. É bonito, isso ninguém tenha
dúvidas, porém, é perigoso. Por isso a importância de ter locais próprios,
designados para tal prática, e uma fiscalização rigorosa”, enfatiza.
Prefeitura
O prefeito de Estância, Gilson Andrade, através da
Assessoria de Comunicação, comentou sobre a ação impetrada pelo grupo de
moradores. “Entendemos que não podemos impedir as pessoas de buscarem seus
direitos, nem de se incomodarem com algo. Então respeitaremos o que a Justiça
decidir. Mas, por outro lado, os fogos são uma tradição estanciana. O poeta já
disse: “Estância tem fogo no ar”. Assim, cabe ao poder público respeitar as
decisões judiciais, mas também garantir que a sociedade possa conservar as suas
tradições culturais e festivas”, afirma.
Segundo ele, a Prefeitura, através da Guarda Municipal e de
parcerias com a Polícia Militar, fiscaliza o cumprimento da lei e busca
controlar os excessos, da forma devida. “Mas vale ressaltar que na Rua Nova,
local em que as guerras de busca-pé ocorrem, as pessoas residentes utilizam
isso para se divertir, colocando telas em suas casas, convidando amigos e
parentes para apreciarem a beleza das disputas de busca-pés, renovando, a cada
ano, essa tradição secular de Estância”, declara.
Para este ano, a Administração Municipal manterá a mesma
estratégia de fiscalização utilizada ao longo dos últimos dois anos, segundo
ele, dando uma atenção especial à antiga Rua do Triunfo, justamente para evitar
que sejam cometidos excessos, em respeito à população. O gestor aproveita para
informar que o Forródromo da cidade, o maior do Estado, capaz de acomodar até
100 mil pessoas, já recebeu serviços de manutenção e está preparado para os
festejos.
“Por se tratar de uma área aberta, nesse momento aplicamos
pintura, capinação e uma decoração muito linda, que enche de orgulho todos os
estancianos e faz a festa de sergipanos e nordestinos em geral”, complementa.
Os festejos juninos em Estância foram iniciados ontem, dia 31, e seguem com
programação cultural e musical pelos próximos 30 dias.
Fonte: Jornal da Cidade
Texto e imagem reproduzidos do site: lagartocomoeuvejo.com.br
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