Publicado no JC 2011 - Osmário - Memórias de Sergipe.
Walmir Almeida: o cinegrafista da cidade.
Por Osmário Santos/JornaldaCidade.Net
Mestre nas lentes atuou na reportagem fotográfica, servindo
a vários governos, montando um acervo de mais de 10 mil fotos que documentavam
os mais importantes lances políticos de Sergipe a partir do governo Leandro Maciel.
Indignado pela falta de apoio para a necessária conservação do importante
patrimônio para a memória do Estado de Sergipe, pegou uma Kombi, jogou dentro
todos os negativos e na proximidade do Aeroclube de Aracaju tocou fogo em tudo,
afirmando que foi o fogo mais bonito que viu em sua vida.
Cinegrafista projetou Sergipe através de documentários que
eram projetados nos jornais cinematográficos nos cinemas do Brasil através da
empresa cinematográfica Atlântica. Foi o pioneiro em cine jornal em Sergipe e um
dos seus trabalhos agradou tanto ao presidente João Goulart, que resolveu
convidá-lo para participar de sua comitiva a uma visita que faria ao Chile e
Uruguai. Como o seu acervo cinematográfico esfriou a cabeça e fez doação do
Cine Clube da Cidade.
Um completo atleta e a grande prova é a conquista de muitas
medalhas jogando futebol e praticando ciclismo. Foi um dos pioneiros no esporte
da vela e um dos fundadores do Iate Clube de Aracaju. No ar é o piloto de maior
números de horas de voos que continua em ativa em Aracaju. Um piloto que já fez
muitas acrobacias sem assustar a própria família, já que seus dois filhos e a
mulher também pilotam.
Filho de Riachão
Walmir Lopes de Almeida nasceu no dia 26 de maio de 1930, na
cidade de Riachão do Dantas, sendo filho de Francisco Lopes de Almeida e Maria
França Almeida. Tudo que faz na vida é fruto das normas de conduta passada com
muito rigor pelo seu pai. “Um homem íntegro, organizado, bom de conselho e
amigo dos filhos”.
No Grupo Manuel Luiz, na cidade de Aracaju, com a professora
Psidônia, passou a conhecer as letras, sempre acompanhado pele olhar firme de
dona Carlota, diretora do grupo, que não descuidava de nenhum dos seus alunos.
Uma pessoa que foi muito importante na sua vida. “Dona Carlota me marcou muito
e por ela tenho uma grande atenção”. Um aluno que saía bem dos deveres e pelo
esforço na aprendizagem conseguia escapar da corretiva régua nas mãos, dada
pelos professores da época.
Trocou Revistas
Quando fazia o curso primário no Grupo Manuel Luiz, morava
numa casa em frente ao Cinema Guarany, que funcionava na esquina da Rua
Estância com a Av. Pedro Calazans. Um cinema onde tudo era possível acontecer.
O proprietário do cinema era o senhor Augusto Luz, com quem Walmir mantinha um
bom relacionamento. O menino Walmir só não fazia o papel de bilheteiro, mas não
perdia um filme e ainda mais munido com um enorme pacote de revistas de
quadrinhos para troca que funcionava nos momentos preliminares da sessão, no
meio do filme quando havia um intervalo na projeção para troca de carretel e no
final, quando tudo era válido em termo de troca e grana, como fim de feira.
Com 13 anos passou a trabalhar para ajudar nas despesas da
casa. Passou a estudar pela noite deixando o dia para o emprego que conseguiu
com o cunhado João Pinheiro de Carvalho, fotógrafo conhecido na cidade que,
além de ter o seu estúdio, era o fotógrafo oficial do Governo de Sergipe. O
estúdio funcionava na Rua João Pessoa, e não faltava o tradicional cavalinho
que os fotógrafos da época usavam para as fotos infantis.
Repórter Fotográfico
Walmir revela que o cunhado João Pinheiro foi um dos
primeiros repórteres fotográficos de Sergipe, tendo aprendido com ele
laboratório e todos os detalhes da arte fotográfica, tendo aprendido, também,
muita coisa de trabalho de repórter fotográfico. Lições tão bem aproveitadas,
que Walmir ocupou a vaga do João Pinheiro no Palácio, quando ele resolveu morar
em Brasília, na época da inauguração da capital do país.
O primeiro contado com a máquina fotográfica aconteceu no
estúdio com aquela máquina profissional, tipo caixão que trabalhava com tripé.
Chegou a trabalhar com a máquina fotográfica caixão e com magnésio. “Não tinha
o flash eletrônico e íamos para a igreja numa cobertura de casamento com aquela
máquina enorme. Tirava-se geralmente só uma fotografia dos noivos e outra,
dependo do casamento, e do noivo com os pais”. Criança que tirava fotografia
com magnésio, nunca mais queira saber de tirar foto, devido ao susto que
levava. Dava aquele estouro, um clarão enorme e cobria o ambiente todo de
fumaça. O cunhado na máquina e Walmir segurando e se preparando para o estrondo
e receber banho de fumaça.
As fotos de casamento eram tiradas dentro da igreja sem
maiores problemas, tendo até padres que faziam questão de aparecer junto com os
noivos. “Ficava a casa cheia de fumaça. Certa feita, num casamento em Estância,
por descuido, o magnésio ficou na bandeira da janela. Quando chegou a hora da
fotografia, com a explosão, os vidros das janelas não resistiram e partiram
para todos os lados, provocando uma correria e tanta. Quando foram procurar os
noivos, eles estavam trancados no quarto e dali não saíram mais pra nada”.
Tempo de ginásio
Na rotina da vida, trabalhando e estudando, chegou o tempo
de fazer o ginásio e Walmir passou a estudar no Colégio Tobias Barreto, que era
dirigido pelo professor Alcebíades Melo Vilas Boas. No Tobias conclui o curso
ginasial e secundário.
Prosseguiu os estudos fazendo vestibular para a Faculdade de
Ciências Econômicas de Sergipe, sendo aprovado logo de saída. Não descuidava
dos livros pela noite, já que o dia era dedicado ao trabalho. Assim foi levando
até concluir o curso superior.
Saindo formado economista, entre a loja de discos e um
emprego no antigo Condese, resolveu optar pelo comércio onde está até hoje.
No governo Leandro Maciel passou a trabalhar como
fotográfico do Palácio. Aproveitava os momentos de folga para supervisionar seu
primeiro estabelecimento comercial, que instalou no edifício Mayara, no 3º
andar, na sala 302. Iniciou na área comercial com um pequeno estúdio
fotográfico. Depois, para um espaço maior no Parque Teófilo Dantas,
oportunidade que passou a comercializar discos e artigos fotográficos. Sua loja
circulou por alguns pontos comerciais no Centro de Aracaju: a exemplo da loja
na Rua Itabaianinha e o da Galeria do Hotel Palace até chegar ao ponto
definitivo no Parque, onde continua prestando um bom serviço aos fotógrafos
amadores de Sergipe, sempre com orientações e tirando dúvidas.
Gosta de ensinar fotografia
Sempre gostou de passar seus conhecimentos fotográficos para
outras pessoas. Assim aconteceu com o fotógrafo do JORNAL DA CIDADE, Geraldo
Santos que aprendeu com ele a profissão de tirar retrato quando ainda menino
trabalhava na loja de Walmir.
No palácio foram 16 anos de cobertura fotográfica, servindo
a diversos governos. No governo de José Rollemberg Leite, lembra-se de um
episódio interessante da sua vida de fotógrafo palaciano. “Tinha um certo
deputado que não se dava bem com o governador. Numa certa tarde os deputados
foram fazer uma visita de cortesia ao governador. Ele, apesar de ser da
oposição, foi no meio. Coloquei minha máquina em ação e fotografei o deputado
cumprimentando o governador. Ele fez de tudo para conseguir a fotografia. Me
procurou e neguei, pois a fotografia pertencia ao Palácio. Um belo dia mandou
me convidar para fotografar uma recepção que estava dando em seu sítio. Eu fui
como profissional e, no meio de todo mundo, o deputado me elogiou pelo meu
caráter e pela minha fidelidade ao governador”.
A Metralhadora
Um outro lance de Walmir aconteceu na sua estreia como
cinegrafista. “Tinha comprado uma máquina de filmar e ia inaugurá-la como o
governador. Os fofoqueiros e os mais ignorantes começaram a espalhar que eu
estava com uma metralhadora com a finalidade de matar Leandro Maciel. Napoleão
Dórea passou para o governador o que estava acontecendo e recebeu a seguinte
resposta: A única coisa que Walmir pode me matar é tirando uma fotografia feia
minha”.
Não participa de concurso de fotografia em Aracaju há muito
tempo e guarda uma certa mágoa. “Cheguei a participar em dois concursos, mas
houve uma certa marmelada e nunca mais”.
Conta que João Pinheiro de Carvalho foi o primeiro a
utilizar da máquina de cinema na bitola de 16 ml para uso de reportagens
sociais em Aracaju. Filmava e apresentava o filme mudo. Walmir diz que começou
a trabalhar profissionalmente com cinema em Sergipe nas bitolas de 16 e 35 ml,
com som, sendo o primeiro de cinejornais em Sergipe.
Cinegrafista
Como cinegrafista, seu nome e suas produções foram exibidos
em quase todos os cinemas do Brasil nos jornais cinematográficos. Fundou o Cine
Produções Atalaia, ideia que pintou na época do governo Luiz Garcia, diante do
incentivo e apoio do secretário Junot Silveira. Imagens que foram reproduzidas
não só no Brasil como no exterior. “Fiz um documentário sobre a seca. O filme
foi para Porto Alegre para entrar numa campanha a fim de conseguir donativos
para os flagelados da seca. Foi até assistido no Planalto, pelo presidente João
Goulart, que me convidou para fazer parte da comitiva presidencial em uma
viagem que ele faria ao Chile e ao Uruguai, como prêmio pelo meu trabalho. Fui
e levei meu equipamento. Na volta, desci no Rio de Janeiro, preparei o filme
num laboratório com edição e voz de Cid Moreira, lançando na frente do Canal
1000 e nos demais”.
“O sucesso foi tão grande que logo recebi o convite para
fazer parte da ponte cinematográfica nacional, passando a ser correspondente da
empresa Atlântica Cinematográfica de Severino Ribeiro, um dos maiores
proprietários de cinema e distribuidor de filmes do Brasil”. Conta que alguns
dos seus filmes foram exibidos na Suécia e na Itália.
Como na época não tinha televisão, o Jornal Cinematográfico
passou por uma áurea fase. O público do cinema gostava da parte esportiva
quando aparecia na tela os times do futebol carioca. Em Aracaju quem aparecia
na tela em algum filme preparado pelo Walmir na sua documentação de bailes e
eventos era prato para todas as conversas. Luiz Garcia e Lourival Baptista
souberam aproveitar bem do jornal cinematográfico, mesmo recebendo algumas
vaias nos cinemas de Aracaju.
Acervos
No campo de filmes, seu acervo foi doado ao Clube de Cinema.
Quanto ao seu acervo fotográfico uma triste história para a memória de Sergipe.
“Eu tinha guardado com todo cuidado as negativas de minhas fotos. Tentei em
vários governos a organização de um arquivo e nada consegui. Então, certo dia,
me chateei, peguei tudo, coloquei dentro de uma Kombi, cheguei perto do
Aeroclube e toquei fogo com gasolina. Foi o fogo mais bonito que eu vi em toda
minha vida”.
Aviação
A aviação é uma paixão velha. Desde o tempo de menino,
quando frequentava constantemente o Aeroclube de Sergipe. De tanta aproximação
com os aviões e conversas com pilotos, aos 12 anos voou pela primeira vez de
carona. No ano de 1962, recebia a licença de piloto privado.
Na aviação prestou muitos serviços, fazendo taxi aéreo.
“Tinha um avião ‘Cesna’ que sempre estava pronto para toda e qualquer
emergência. Realizou muitos voos chamados de coqueluche: “É o único remédio
realmente bom para curar uma criança que está com coqueluche”. A gente voa de
manhã cedo, vai até 2.000 pés e resolvido o problema”. Nos conta que tinha um
voo da coqueluche e que era realizado diariamente, como um santo remédio. Como
o avião de Walmir era pequeno, só dava um doente, acompanhado do pai ou da mãe.
Na aviação muita gente doente foi deslocava para Salvador,
através do avião de Walmir numa época que era o único taxi aéreo em
disponibilidade na cidade. Resolveu problemas de políticos e empresários mais
comprometidos com o tempo. É piloto veterano da cidade que continua na ativa,
com todas as condições físicas, pois técnicas nem se fala já que detém o maior
número de voos com 1.200h.
Esporte Náutico
Sócio fundador do Iate Clube de Aracaju, juntamente com
Carlos Morais, Álvaro Bezerra e outros amigos, sempre se reuniam para falar de
esportes náuticos, mesmo antes da fundação do clube. “Álvaro, que é pai de
Thaïs Bezerra, construiu o primeiro snipe em Sergipe. O barco foi construído
direitinho e deu certo. Logo em seguida, eu comprei o primeiro snipe em Porto
Alegre e esse barco veio de avião”.
Um atleta por excelência de fazer inveja a Collor, pois
praticava esporte em terra, mar e ar. Atuou no futebol, no remo, praticou
natação, recebeu vários prêmios pelas conquistas de regatas na categoria snipe
e continua sorrindo lembrando de suas vitórias. “No ciclismo, fazíamos corrida
saindo da Ponte do Imperador até a Ponte da Atalaia. Numa corrida dessas, eu
tinha comprado uma bicicleta famosa, a Hércules e resolvi colocar pra ferver.
Sai em disparada na frente e resolvi dar uma olhada nos demais concorrentes,
bem na frente da Capitania dos Portos. Quando olhei pra trás, percebi que os
outros estavam distantes, me descuidei um pouco, bati num carro, perdi a
corrida e a bicicleta”.
Família
Casou com Carolina Menezes Almeida, no dia 05 de setembro de
1964, e dela possui dois filhos: Walmir Lopes de Almeida Júnior, e Carlos
Eduardo Menezes Almeida. A maior honra de Walmir é dizer que sua mulher e seus
filhos pilotam.
Texto reproduzido do site: jornaldacidade.net
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Imagem ilustrativa.
Recorte de Jornal/Arquivo Eduardo Almeida.
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