Publicado originalmente no site JLPOLÍTICA, em 21 de Janeiro
de 2020
Opinião – Levem a cultura a sério
Por Irineu Fontes*
Existem diferentes conceitos e usos da palavra cultura em
moda na contemporaneidade. A cultura é transversal, pois atravessa diferentes
campos da vida cotidiana.
Desde os anos 90, quando passo de executor para agente na
área cultural, busco conhecimento, caminhos e formas, tentando entender a
política cultural e fazer o melhor para gestão.
Um dos conceitos que sigo é do Nestor Garcia Canclini, na
qual a política cultural é: "El conjunto de intervenciones realizadas por
el estados, las instituiciones civiles y los grupos comunitarios organizados a
fin de orientar el desarrollo simbólico, satisfacer las necesidades culturales
de la población y obtener consenso para un tipo de orden o transformación
social. Pero esta manera necesita ser ampliada teniendo en cuenta el carácter
transnacional de los procesos simbólicos y materiales en la actualidad".
Mas a vida mostra na prática o real sentido da cultura e
reforça o trabalho de quem se propõem a fazer gestão.
Em algumas conversas com fazedores e com a população por
onde passei, nos encontros, conferências e seminários, falam-me o que é cultura
para eles:
“Meu amigo, cultura são minhas mãos inchadas, pés cortados
nesse chão, seco, mas com esperança sempre de que tudo vai melhorar”, explica
seu José Agricultor.
“Cultura é meu canto, minha palavra, minha dança”, afirma
Nadir da Mussuca
“Cultura é a minha renda irlandesa, é a poesia do João
Sapateiro, é o tricô de Odete e da Maria, costurando cobertor de tacos de
panos”, diz Nalva de Laranjeiras.
“Cultura é valorizar a vida das pessoas, conforme seus
pensamentos, sua crença e sua criação. É ser valorizado”, aponta o escultor
Demar.
“Cultura é tudo que você imagina, realiza, sonha, projeta e
ajuda a transformar realidades”, reforça Joeldo.
“Cultura é meu amor e respeito pelas tradições dos meus
antepassados”, afirma Mestre Zé Rolinha.
Percebi que, mesmo a população que identifica a cultura como
obras e práticas artísticas, das ações intelectual e da festa (entretenimento),
há sempre uma ressalva que associa “arte” com “povo”.
De todos os modos, o papel central que a cultura exerce na
vida da sociedade contemporânea exige uma atuação efetiva do gestor público.
Temos que aprender a ouvir, entender, assimilar, alinhar os
conhecimentos e atender as demandas da sociedade e não colocar unicamente seu
ponto de vista ou concepção política, religiosa ou moralista à frente das ações
governamentais.
Dito isso, não podemos esperar de um Governo que atacou os
artistas, primeiro com a Lei Rouanet, depois acabando o Ministério da Cultura,
um Governo que segue um pensamento de um astrólogo que nem mora no Brasil, e
ainda coloca à frente de uma entidade da Cultura, alguém que tem concepções
altamente religiosas, um fanático, um especialista na “estética da penumbra” um
intolerante em uma pasta profana, democrática e livre.
A demissão do Roberto Alvim (então, secretário da Cultura do
Governo Bolsonaro) não foi pelo motivo da incapacidade e incongruência para o
cargo, e sim por não ser politicamente correto, e um grande imbecil puxa saco
nazista.
Com a saída dele corta o rabo, mais não mata a cobra.
O gestor público é um agente pago para trabalhar políticas
públicas de valorização, formação e difusão da cultura diversa existente.
Como posso ser fanático religioso e gerenciar o profano?
Como posso ser preconceituoso se tenho que respeitar os conceitos?
Sou do tempo do "Liberté, Egalité, Fraternité. Não me
importa a esquerda nem a direita.
No Brasil, um País de extremo centro, “é só lembrar do
passado e dos acertos”, o que me importa mesmo é a democracia, a liberdade e a
cultura.
Estejamos atentos e fortes.
* É ex-secretário de Estado da Cultura, ex-secretário de
Cultura de Laranjeiras, ex-diretor dos Teatros Tobias Barreto e Atheneu, atual
coordenador da Escola do Legislativo da Alese.
Texto e imagem reproduzidos do site: jlpolitica.com.br
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