Imagens simplesmente ilustrativas, postadas por Isto é SERGIPE.
Publicado originalmente no site do Jornal da Cidade, em
05/08/2013.
Sergipe artístico, literário e científico
Por: Cristiane Vitório de Souza.
A memória intitulada “Sergipe artístico, literário e
científico”, redigida por Joaquim do Prado Sampaio Leite e editada
pioneiramente pela Imprensa Oficial, foi encomendada por Manoel Corrêa Dantas,
Presidente do Estado de Sergipe, para ser apresentada na Exposição
Ibero-Americana de Sevilha. Essa exposição, com o tema “Indústria, Arte,
História e Comércio”, realizada entre 9 de maio 1929 e 31 de junho 1930, tinha
como objetivo reforçar os vínculos entre a Espanha e a América. Desde os tempos
de Dom Pedro II, o Brasil costumava participar dessas exposições
internacionais. Os políticos e intelectuais da época consideravam que era a
oportunidade de evidenciar que o país, ao contrário do que os observadores
estrangeiros imaginavam, caminhava a passos largos em direção à civilização.
Para Sergipe, o menor estado da federação, participar de uma exposição como
essa significava a possibilidade de apresentar para os mais de dois milhões de
pessoas que a prestigiaram o seu progresso, representado pelo talento dos seus
intelectuais.
Por que a escolha do presidente recaiu sobre Joaquim do
Prado Sampaio Leite? Filho do farmacêutico Joaquim do Prado de Araújo e Dona
Lídia Carolina Alves Sampaio, esse sergipano que nasceu no dia 3 de junho de
1865, em Aracaju, após estudar as primeiras letras com os professores Cipriano
José Pinheiro e Manoel Alves Machado e o secundário no Ateneu Sergipense,
seguiu a trajetória dos intelectuais com capital social elevado,
matriculando-se na Faculdade de Direito de Recife e tornando-se bacharel em
1889.
Exerceu diversos cargos públicos em Sergipe e Pernambuco. No
estado natal, ocupou a promotoria pública em Japaratuba, Itabaiana, Aracaju e
Maruim e a magistratura em Lagarto e Gararu. Em Pernambuco, foi juiz em
Vitória, Secretário de Polícia e advogado nos foros de Vitória, Camamu, Nazaré
e Limoeiro. Também foi deputado estadual, um dos responsáveis pela elaboração
da primeira Constituição de Sergipe, e professor do Ateneu Sergipense durante
vários anos ensinando Literatura, Psicologia e Lógica.
Participou da criação de importantes associações científicas
como o Instituto Histórico Geográfico de Sergipe, do qual foi um dos principais
oradores, e a Academia Sergipana de Letras. Escreveu em diversos periódicos
como Jornal do Recife, Diário de Pernambuco, Estado de Sergipe, Jornal de
Sergipe, Sergipe Jornal, Correio de Aracaju, Diário da Manhã e Revista do
Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe. Como polígrafo, característica dos
intelectuais daquele período, escreveu obras que podem ser enquadradas em
diversos campos do conhecimento como o Direito, a Literatura, a Filosofia, a
Etnologia, a Geografia, a História e a Psicologia.
Portanto, Prado Sampaio era um dos principais líderes da
cena intelectual sergipana, prestigiado tanto pelos mais experientes quanto
pelos mais jovens. Certamente, esse perfil deve ter influenciado o presidente a
escolhê-lo para redigir a memória. Ainda pode ter contribuído o fato de Prado
Sampaio ter publicado em 1908, “A Literatura Sergipana”, obra sobre o mesmo
tema, que foi reaproveitada na elaboração de “Sergipe artístico, literário e
científico”.
Prado Sampaio dividiu a obra em introdução, seis capítulos e
uma conclusão. No intróito, sob o influxo das ideias cientificistas de Ernest
Haeckel e Friedrich Ratzel adaptadas à realidade brasileira, esclarece que as
manifestações culturais devem ser analisadas a partir dos conceitos de raça
(elemento estático) e meio (elemento dinâmico), que são responsáveis pela
diferenciação e integração da cultura nacional. Nos capítulos, assevera que
Sergipe, tanto do ponto de vista etnológico quanto do mesológico, propicia a
eclosão de talentos, que inclusive auxiliaram no desenvolvimento da literatura
e da ciência nacionais, a exemplo de Tobias Barreto, Sílvio Romero, João
Ribeiro, Gumercindo Bessa, Fausto Cardoso, Felisbelo e Laudelino Freire.
Apresenta manifestações culturais como a poesia, a filosofia e a música,
destacando os seus principais representantes e os mais significativos centros
intelectuais (São Cristóvão, Itabaiana, Lagarto, Estância, Laranjeiras, Maruim
e Aracaju). Porém, recorda que em “A Literatura Sergipana” afirmara que os
sergipanos viam-se obrigados a emigrar em busca de prestígio em centros
intelectuais mais desenvolvidos porque nosso estado ainda não tinha condições
de consagrar os gênios locais, em virtude da inexistência de um público
cultivado, capaz de consagrar seus talentos, de uma imprensa vigorosa, capaz de
torná-los conhecidos em outros pontos do país, de bibliotecas e academias
opulentas e de um sistema de ensino renovado, essenciais para o desenvolvimento
da atividade intelectual. Em “Sergipe artístico, literário e científico”, o
autor mostra-se mais otimista, pois observa que algumas décadas depois a
imprensa, a biblioteca e a educação apresentavam-se mais evoluídos, oferecendo
aos intelectuais nativos o ambiente adequado para o desenvolvimento de suas atividades.
Considera que o campo intelectual local atravessa “uma fase de alentado
revigoramento e largas esperanças”. Conclui que Sergipe, apesar de ser um
estado acanhado do ponto de vista territorial, é privilegiado em matéria de
talento e que graças a ele é possível vislumbrar um porvir luminoso.
A reedição da obra “Sergipe artístico, literário e
científico”, de Joaquim do Prado Sampaio Leite, que passa a integrar a Coleção
Biblioteca Casa de Sergipe, criada a partir de um convênio entre a Universidade
Federal de Sergipe e o Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe, é uma
importante contribuição para os estudos sobre a cultura sergipana. A leitura
desse texto de sabor cientificista permite a um só tempo conhecer um pouco da
arte e da literatura de Sergipe no Império e no alvorecer da República e
compreender como as ideias de cientistas cultuados na Europa e no Brasil foram
adaptadas por um homem de ciência para explicar o desenvolvimento cultural do
seu torrão natal (...).
Texto reproduzido do site:
jornaldacidade.net/artigos-leitura
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