segunda-feira, 10 de abril de 2017

Amendoim verde cozido é patrimônio imaterial de Sergipe

 Plantação de amendoim irrigado no Povoado Antas, em Malhador/SE.

 Amendoim sendo colhido nas roças do interior de Sergipe.
Foto: Jorge Luiz/TV Sergipe.

 Cozimento do amendoim depois que é retirado da terra.
Foto: Jorge Luiz/TV Sergipe.



Fotos: Anderson Barbosa/G1.

Publicado originalmente pelo site G1 SE., em 08/04/2017.

Amendoim verde cozido é patrimônio imaterial de Sergipe.

Sabor desperta interesse de turistas de várias partes do Brasil. Litro do amendoim está mais caro por causa da seca que o estado enfrenta.

Por Anderson Barbosa, G1 SE, Aracaju.

No Mercado Municipal de Aracaju (SE) o amendoim pode ser encontrado em fartura nas bancas que se espalham pelo local. Molhadinha ou mais seca, a semente verde cozida, protegida por uma casca, é um dos produtos mais procurados por sergipanos e muitos turistas.

E por falar em turistas, são eles quem movimentam a venda da semente da família das oleaginosas, consumida o ano inteiro nas praias e bares da capital e interior do estado. “Este tipo de amendoim só é vendido aqui. Tem muita gente que leva para São Paulo, Brasília, Recife e outras partes do Brasil”, conta Edvaldo de Oliveira, que vende no local há mais de 20 anos.

"Nunca encontrei um amendoim tão gostoso como o de Aracaju" - Vagner Sena , turista do Rio de Janeiro.

Foi quebrando a casca e provando o que tinha dentro dela, que o jornalista do Rio de Janeiro, Fábio Ventura, descobriu um sabor bem diferente do que estava acostumado. Toda vez que volta a Aracaju sempre arruma espaço na bagagem para levar o fruto.

“No Rio a gente não é muito acostumado a comer esse tipo de amendoim porque ele já vem comercializado nos saquinhos, nas opções de salgado e doce. O que experimentei em Aracaju era mais rústico e tinha um sabor bem diferente do que estava acostumado. A gente percebe que ele vem direto do campo para a mesa”, conta o jornalista.

Pra que nasceu em Aracaju e há 50 anos passou a morar na Cidade Maravilhosa, ficar distante do local de origem do amendoim cozido exige um pouco de paciência. “Todas as vezes que retorno a Aracaju a primeira coisa que eu faço é comprar amendoim. A gente sempre encontra na frente do supermercado, nas praças, no mercado municipal e quando volto para o Rio levo bastante. Igual ao amendoim de Sergipe não existe em lugar algum”, conta a cuidadora de idosos Adilia Sena.

Depois de morar 10 anos em Aracaju, o motorista carioca Vagner Sena conta que sente falta do sabor do amendoim que se acostumou o comer em Sergipe. Quando há oito meses voltou a morar com a tia no Rio de janeiro, não deixou de levar a encomenda para toda a família. “É lei levar na mala por ser diferenciado, cozido, porque no Rio a gente só come o torrado, que é totalmente industrializado. Nunca encontrei um amendoim tão gostoso como o de Aracaju”, afirma.

Patrimônio Imaterial

O modo de preparar o amendoim verde cozido neste pedaço do Nordeste, que depois de arrancado da terra é cozido na água, sal e limão, virou Patrimônio Imaterial de Sergipe no ano de 2013, através do projeto lei aprovado na Assembleia Legislativa de Sergipe (Alese).

“O amendoim produzido no estado não chega a amadurecer direito. O de fora, como o de Alagoas, os produtores deixam ficar mais maduro porque usam na fabricação de óleo e só serve maduro. Arrancando caroço verde é mais molinho e a gente consegue pegar mais preço”, explica o vendedor Edvaldo de Oliveira.

Segundo a Empresa de Desenvolvimento Agropecuário de Sergipe (Emdagro), os últimos dados da produção do amendoim são de 2015 quando acumulou 3.824 toneladas, contra 3.572 do ano anterior. Tudo que é produzido no campo é repassado para atravessadores, que levam o produto às feiras livres da região, e à Central de Abastecimento de Sergipe, além do Mercado Central da Capital, praias da Orla da Atalaia e do todo o litoral do estado.

"É um produto importante para nossa agricultura, que virou também um símbolo. No estado ainda não existe um programa de incentivo a esta cultura, mas é possível sim construir uma ação dialogando com os produtores e a Emdagro" - Esmeraldo Leal, secretário da Agricultura de Sergipe.

A produção se concentra na Zona Rural de 38 municípios, sendo que os cinco maiores produtores são: Itabaiana, Areia Branca, Lagarto, Moita Bonita e São Domingos. “O da região de Malhador e Itabaiana é diferente. É um amendoim selecionado, limpo, mais alvo e mais gostoso do que o que vem de fora. Tem qualidade e é mais caro. Atualmente o litro custa R$ 6, enquanto o que está vindo de Alagoas está custando R$ 4, o litro, e fazemos três por R$ 10”, aponta mais esta diferença o vendedor José Eduardo.

O secretário da Agricultura de Sergipe, Esmeraldo Leal, ressalta que o amendoim é um dos grandes orgulhos do estado, produzido principalmente na Região do Cotinguiba. “É um produto importante para nossa agricultura, que virou também um símbolo. No estado ainda não existe um programa de incentivo a esta cultura, mas é possível sim construir uma ação dialogando com os produtores e a Emdagro”, explica.

Sobre a lei que tornou o amendoim Patrimônio Imaterial de Sergipe, o secretário informa que a aprovação dela ajudou a aquecer a economia do estado, aumentando o consumo e ganhando força em outros estados. “Isso movimentou o turismo e a nossa auto estima. O amendoim cozido verde é um diferencial e um orgulho para todos nós”, completa.

Amendoim fonte de renda

Antônio dos Santos tem 50 anos e desde os 15 comercializa amendoim nas ferias livres da Capital. A banca onde atualmente trabalha recebe visita de turistas de várias partes do Brasil. “Aqui passa gente de Salvador, Pernambuco, Manaus, Rio Grande do Sul, de vários lugares”, conta.

O produto é a única fonte de renda dele, que mora sozinho. “O meu salário depende da movimentação dos clientes. Tem meses que dá bom, outros um pouco pior, mas a média é uns R$ 700 a R$ 800. Já cheguei a tirar mais de R$ 1 mil, isso nos meses de junho, quando a tradição de comer amendoim é maior por causa das festas juninas”, justifica.

Antônio explica que foi a falta de oportunidade no mercado de trabalho que o levou a vender o produto. “Não tinha emprego e fui me virando. Nunca trabalhei de carteira assinada. Era menor de idade quando comecei a trabalhar assim. Entrei e não saí mais", diz.

Assim como ele, pelo menos cerca de 5 mil pessoas, vivem em Sergipe da produção e comercialização do grão, segundo o projeto lei apresentado na Assembleia Legislativa de Sergipe, que tornou a leguminosa Patrimônio Imaterial do Estado.

A plantação

O Povoado Antas, município de Malhador (SE), é um desses locais onde as roças da oleaginosa podem ser encontradas facilmente. A agricultora Maria Pureza dos Santos planta amendoim há cerca de 25 anos, separou este ano duas tarefas e meia para o cultivo, que só iniciou no final de março por causa do atraso nas chuvas. “Se chover certinho a gente vai conseguir tirar até 15 quartas desta roça, vendendo entre R$ 450 e de R$ 600 a quarta de 200 litros”, conta esperançosa.

Após 70 dias, ela já deve colher o fruto e começar a ganhar dinheiro com a roça que domina a povoação. “O amendoim dá com três meses, aí é um dinheiro mais rápido, porque a mandioca a gente planta mais, porém só colhe com um ano, um ano e meio”, justifica.

O agricultor José Silvânio Santos Nascimento explica que o custo com a roça do amendoim é outro diferencial. “Comparado a outras lavouras é barato se tiver a semente, que a gente já guarda da safra anterior. Depois é só cuidar da adubação da terra e duas limpas de enxada. Antes dos três meses está no ponto de colher. Cada tarefa tira 10 a 11 quartas de amendoim”, conta.

Silvânio explica que os agricultores do povoado não fazem a parte do cozimento, processo que é realizado por compradores de Moita Bonita (SE), e de lá o principal produto do povoado percorre o país. “O amendoim é uma salvação para nossa comunidade. Sem ele a gente não teria uma boa renda a cada três meses”, diz aliviado.

O lugarejo com poucas residências também possui roças com a semente cultivada de forma irrigada, possibilitando até quatro safras por ano. “Agora é o que tem mais por aqui e o preço também está bom, variando a quarta de R$ 500 a R$ 600“, afirma.

O preço.

A longa estiagem que se arrasta nos últimos três anos em Sergipe afetou diretamente a produção do amendoim, que nos últimos três meses sofreu um aumento significativo no litro. No Mercado Municipal de Aracaju, o preço do amendoim que vem de Alagoas varia entre R$ 4 e R$ 6, o litro. “O de Itabaiana (SE), o saco com 100 litros está custando pra gente R$ 400, era 200 há cinco meses, o de fora a mesma quantidade saí por R$ 250. Depois que a seca apertou tudo ficou mais caro porque até as irrigações estão paradas”, informa o vendedor José Eduardo.

No calçadão de Aracaju, que fica a poucos metros do mercado, também é possível encontrar muitos vendedores, mas o preço só fica mais salgado. O mesmo litro pode sair por até R$ 7 reais, mesmo assim tem gente que gosta tanto do sabor que não se importa. “Sempre com o amendoim de Itabaiana, que mesmo sendo mais caro, tem qualidade”, justifica o motoboy Orando dos Santos Júnior.

E quem gosta do produto não deixa de consumir e se não pode levar dois litros leva um. “Agora a gente tem mais um motivo para saborear e valorizar este produto que a gente ama e já caiu na graça do Brasil”, diz a cabeleireira Maria José Rocha.

“A seca não atingiu somente o Sertão e o Semi-Árido sergipanos, mas também os municípios com força na produção como Malhador, Divina Pastora, Riachuelo. Além dessa seca impactar o produtor que depende do ciclo de chuva, também sentimos uma pressão muito forte dos perímetros irrigados da Companhia de Desenvolvimento de Recursos Hídricos e Irrigação de Sergipe (COHIDRO), que produzem amendoim e que, infelizmente, com a diminuição dos volumes de água, alguns tiveram dificuldade para manter a irrigação e, com isso, diminuiu a produção nos perímetros, inflacionando o preço do produto”, explica o secretário de agricultura Esmeraldo Leal.

Mesmo com a seca que continua, o secretário assegura que não vai faltar o alimento na mesma do sergipano neste São João, já que ele faz parte da culinária junina de Sergipe.

Texto e imagens reproduzidos do site: g1.globo.com/se/sergipe

Nenhum comentário:

Postar um comentário