Jozailto Lima, “Ainda os lobos” e uma poética do afeto e de
outras inquietações.
Não é verdade que a poesia no Brasil esteja em baixa. Muito
menos morta. Ainda que não seja parte da vida das pessoas como o fora até anos
70 do século passado, quando todo mundo suspirava ao redor dela e boa parte dos
brasileiros até “acometia”, a poesia resiste.
Resiste e manifesta-se numa densa produção e em editoras que
se especializam em publicá-la. O poeta Jozailto Lima, o livro dele “Ainda os
lobos” e a editora paulista Patuá se encaixam bem neste contexto. Aos 55 anos,
ele lança em Aracaju (...) seu quinto livro. Aos cinco, a Editora Patuá já
beira os quase 400 títulos publicados.
“Creio que a poesia ocupa o lugar de sempre: o do paladar
dos que gostam da palavra de um modo diferente, e o da discrição. E assim ela
sobreviverá”, diz Jozailto. “O Brasil vive uma fase extraordinária na produção
de poesia de qualidade. Temos muitos e bons poetas. É óbvio que precisamos
brigar para encontrar e formar leitores. Mas a pouca receptividade não diminui
a qualidade dessa produção”, diz o editor dele, Eduardo Lacerda.
Se depender da poesia de Jozailto Lima, sim, essa modalidade
vai subsistir, e para sempre. E fazendo bem ao gênero e a quem por ele se
afeiçoa. Autor há 30 anos, quando publicou “A Flor de Bronze”, seu o primeiro
livro aos 25, esse poeta é dono de uma poética do afeto e de outras
inquietações.
Em 1985, ao deparar com alguns poemas dele por carta, Carlos
Drummond de Andrade foi direto ao ponto: “Você acerta no importante. Gera e
transmite emoção no seu grave sentimento de vida”. É disso que fala a poesia de
Jozailto do primeiro ao quinto livro: vida.
Fortemente marcada por um tom perqueridor do sentido da
existência, a poesia dele posta-se na fonteira de quem toma parte direta na
vida. “A poesia de Jozailto busca expressar uma essência, com fortes traços
memorialísticos. É como se a paisagem da infância lhe desse a régua e o
compasso para a compreensão do mundo”, escreve em prefácio de “Ainda os lobos”
o poeta Paulo Lima.
“E a partir dessa visão de mundo nascem seus “ribeirões
verbais”. Não é à toa que ele foi buscar na mineira Adélia Prado uma das epígrafes
do livro: “O que precisa nascer/ tem sua raiz em chão de casa velha”. É a “casa
velha” que ecoa nas retinas desse poeta. É como se os elementos de sua poesia
estivessem sempre retornando a um instante primordial, a uma pureza quase
mineral”, completa.
Jozailto tem uma poética nada blasé. Evoca passados e
tritura presentes. Sem um olhar passadista. Dois poemas diferentes dizem de
pontos de vista iguais desse autor. Em “Gravura familiar”, acalanta a infância
e a ternura dos seus: “o melhor lugar do domingo/ era o cangote do pai.// dali,
eu via a aurora/ tecer a luz/ e o horizonte inventar larguras”.
Em “Ao rés da fera”, cavouca os vazios do país aturdido em
que vive e onde escreve:“do país profundo,/ de patas fortes/ e abas largas,/
cheirando a âmago/ e guabiroba, nada/ resta. e nada restará.// avariado está/ o
caminho das águas,/ o labor das abelhas;// e da razão dos lobos,/ fez-se
lenha;/ da lenha,/ brasas mortas/ sobre as quais pisam pés morenos,/
brasileiros, de inativo afeto./ ao rés do chão,/ sem giz nem carvão// alheio/
a/ qualquer uivo// eis a fera que um dia / se quis profundo país”.
Em 1996, em prefácio ao segundo livro de Jozailto,
“Plenespanto”, o contista Antônio Carlos Viana já apontava um nexo da poesia
desse autor com uma visão universal. “A poesia Jozailto Lima é uma poesia de
ideias, enunciadas com forte tom emocional”. “É assim que ele concebe a poesia:
dizer o mundo apoiado na emoção. O leitor perceberá que desse universo tão
pessoal brotam reflexões que são comuns a qualquer homem que se indague sobre o
seu estar no mundo”, disse Viana. Por essas e outras, é possível garantir, sim,
que a “fera que um dia” se quis poesia certamente haverá de se manter viva.
Texto e imagem reproduzidos do sitedobareta.com.br
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