quarta-feira, 12 de abril de 2017

A "Ultima" da Fila


Publicado originalmente no Facebook/Lilian Rocha, em 11 de abril de 2017.  

A "Ultima" da Fila. 
Por Lilian Rocha.

Se me fosse possível imitar uma das virtudes de minha mãe, eu escolheria, em meio a tantas, a que eu gosto mais: a virtude de passar despercebida.

Levamos a vida toda querendo fazer algo de grandioso, algo que nos eleve perante outros. Cultivamos o orgulho e a vaidade de assinarmos, ao final de cada obra, a fim de que nosso nome se imortalize na memória de todos e nos esquecemos, no entanto, de que, se quisermos ser os maiores, é no último lugar que devemos nos colocar, pois este ninguém nos pode arrebatar.

Nem sempre essa virtude é bem compreendida entre a humanidade. Quase todos nós a confundimos, constantemente, com um aniquilamento total da personalidade. Afinal, se sabemos que somos bons em alguma coisa, por que haveria razão de não querermos exibir nossas virtudes? Seria certo deixarmos de fazer o que somos capazes, só para não aparecermos diante dos outros?

Entretanto, a humildade não consiste em se esconder para não fazer nada, mas em não ficar se admirando, depois de ter feito o máximo. Não se pode ser, ao mesmo tempo, espectador e ator. O bom artista está todo inteiro em sua obra, mas apaga-se diante dela, para que todos a vejam.

Minha mãe sempre foi assim: uma artífice da humildade, virtude que soube cultivar, como ninguém, ao longo dos seus quase 89 anos. Quem a via, imaginava-a frágil, calma, incapaz de agir ou reagir diante da vida. Mas nós, que a conhecíamos tão bem, sabíamos que essa fragilidade se transformava em valentia quando lhe era dado o momento certo de agir.

Foram várias as provas de coragem que minha mãe nos deu, ao longo de todos esses anos, principalmente diante da morte. Quando tudo parecia silenciar, eis que sua voz se fazia ouvir, entoando canções a Deus, que nos agasalhavam o coração e nos enchiam de paz. Sim, era CANTANDO que ela se despedia dos que amava. E foi também cantando que nós a vimos dizer adeus a seu primeiro filho, Ricardo. Naquele triste dia de setembro de 2006, eu tive a prova definitiva de que minha mãe não era de verdade...

Incansável no ato de servir, ninguém lhe deve ter escutado um ‘não’. E foi com mansidão que ela nos ensinou a não temer a vida, a enfrentar com dignidade o que porventura nos fosse colocado na frente. “Os problemas da gente, minha filha, são sempre menores que os dos outros, basta que não olhemos demasiadamente para nós mesmos” - dizia ela.

E esquecendo-se de si mesma, foi passando despercebida pela vida, deixando para os outros os aplausos e as homenagens.

Obrigada, mãe, pelas tantas lições de vida, de coragem, de fé, de sabedoria e de humildade que você nos ensinou. Infelizmente somos obrigados a confessar que por mais que tentemos, jamais conseguiremos imitar o seu exemplo.

Cansamos de vê-la na última fila, a se doar inteiramente por nós.
Hoje o céu está em festa com a sua chegada e tenho certeza de que o melhor lugar da primeira fila é seu, pois não é sempre que chega alguém tão pronta, tão preparada...

Tentaremos cantar na sua despedida, mas não repare se, por algumas vezes, os versos ficarem presos na garganta, misturando-se às nossas lágrimas que não param de cair...
Somos meros aprendizes de sua coragem, tentando ainda lidar com essa coisa estranha, chamada saudade...
Boa viagem, mãe, que Deus a acompanhe!

Texto e imagem reproduzidos do Facebook/Lilian Rocha.

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