segunda-feira, 3 de abril de 2017

Aplausos para o Museu da Gente Sergipana


Publicada originalmente no site do Jornal do Dia, em 14/06/2014.

Aplausos para o Museu da Gente Sergipana.
Por Raymundo Mello*

A convite de minha nora, estudante do curso de Museologia da UFS, na quarta-feira, 28 de maio de 2014, visitei o Museu da Gente Sergipana. Identifiquei-me na entrada, registrando ser a minha primeira visita e espero não seja a última porque ali tem muito mais coisas que preciso ver. Claro, não vi tudo, o tempo de permanência naquela manhã foi curto e estou prometendo a mim mesmo voltar para novas visitas.

Ao sair, ofereceram-me um livro de registro e me foi facultado deixar alguma impressão que julgasse justa. Não me furtei à oferta e após assinar deixei como impressão uma única palavra: Chorei! E com ela quis dizer tudo que me veio à alma imensamente admirada, repleta de respeito, carinho e saudade, evocação de grandes lembranças, recordação afetuosa do período de ouro que vivi ali naquele prédio bonito, suntuoso, repleto de memória e memórias. Foram quatro anos e três meses estudando e vivendo da 1.ª à 4.ª série do Curso Ginasial (a festa de formatura - quanta lembrança), 1945 a 1948 e mais três meses de estudos no 1.º ano do Curso Científico (1949) - fevereiro, março e abril -, quando tive de interromper a vida de estudante com 16 anos de idade para assumir um emprego com carteira de trabalho de capa vermelha, específica para trabalhador menor; àquela época, o Colégio Atheneu Sergipense era dirigido com dedicação e respeito pelo Professor Joaquim Vieira Sobral. Só alguns anos depois, quando o Colégio Tobias Barreto, sob a direção do Professor Alcebíades Mello Vilas Boas, instalou o Curso Científico noturno é que pude fazer os estudos correspondentes ao interrompido em 1949, três anos também vividos com muito respeito como estudante de uma etapa curricular que hoje já não existe, foi incorporada no sistema educacional com outra denominação - Ensino Médio, salvo engano. Mas, a partir daí, a área de estudos enquadra-se em outra história.

E por que chorei? Emoção e saudades. Emoção de ver o registro de pessoas e fatos da história de Sergipe registrados com cuidado admirável, bens patrimoniais acomodados com grande seriedade, alguns (como o fabuloso Carrossel de Tobias) com restaurações de alto nível, além de histórico bem organizado e enriquecido com textos importantes de escritores e poetas (Jacinto Figueiredo, Freire Ribeiro, Murilo Mellins e tantos outros) o registro de figuras extraordinárias que deram vida e arte a Sergipe (Zé Peixe - grande figura humana, J. Inácio, Maria Thetis Nunes, a Professora Thetis que me levou a uma 2.ª época em Geografia na 2.ª série ginasial e por quem mantive respeito e sempre trocávamos algumas palavras a cada reencontro), e muito mais coisas, fatos e pessoas que ainda quero rever, registrar e recordar.

E saudades - dos professores Barreto Fontes, Monsenhor Alberto Bragança, Padre Felix, Gentil Tavares, Felte Bezerra, Napoleão Dorea, Padre Gileno, José Augusto da Rocha Lima, Paulo Bragazzi, Maria Sylvia, Maria Thetis, Zequinha Cardoso, Zé Olino, Manoel Franco Freire, e tantos outros que com generosidade nos transferiam saber. Dos colegas, foram tantos, e naquele tempo, sem os recursos da Informática, desapareceram da lembrança e reaparecem quando querem com recordações de momentos e fatos. Cito - Hugo Costa, Odilon Mendonça, Paulo Mendonça, Sidarta Gautama, José Vieira (Caranguejo), Chico Faro, Raymundo Ribeiro, Pedrito Ribeiro, Gilvan Rocha, Walter Mendonça, Luiz Ariquitiba e tantos outros que estão em minha memória de idoso mas os nomes ou apelidos me fogem (reproduzo as imagens na mente mas os nomes não ficam). Como eu gostaria de rever o nosso quadro de formatura, Turma de 1948, alunos que, juntos, capitaneados pelo Professor José Olino, fizemos uma viagem de estudo (termo bonito) a Paulo Afonso - 25 ou 30 de nós na carroceria de um caminhão cedido por um órgão público, sem qualquer proteção para o sol escaldante, estradas de piçarra e uma viagem de 2 dias de ida Aracaju - Jeremoabo - Paulo Afonso e 2 de volta porque o motorista precisava de um repouso. Éramos jovens e saudáveis para aguentar a barra.

Revi as salas onde estudei, hoje adaptadas para os registros do museu, lembrei o Sargento Leite nos dando aulas na turma do Pré-militar, ensinando a armar e desarmar um fuzil e nos falando com veemência sobre a trajectória da bala quando disparada - era trajectória mesmo.
E então, tive que chorar, com emoção e saudade, passando dos 80, fica difícil segurar.
O museu está completo? Não, ainda falta muito e breve virão. Como dizia Luiz Antônio Barreto, o hoje só existe porque existiu o ontem, que deve ser lembrado amanhã e registrado para depois, depois e depois.
Apegado às palavras de Luiz Antônio Barreto, me permito sugerir: João Mello, Raimundo Santos (Perelué), Carnera (Ursino Fontes de Araujo Góes), Maestro Genaro Plech, Dr. Osvaldo Leite (colecionador), Robson dos Anjos e tantos outros, inclusive, a cantora e forrozeira Clemilda que ainda está viva e é bom que seus testemunhos sejam colhidos enquanto ela poderá autenticá-los, e tantas outras pessoas que enriqueceram, cada um a seu modo, a cultura sergipana.

Quanto ao primeiro citado (João Mello), cantor, compositor, poeta, escritor, que viu-se obrigado a sair de Sergipe por perseguição política já que era socialista consciente, estudioso, e que ao compor a canção João Ventura foi fichado como comunista (que ele não negava) e teve que partir para outros pontos do Brasil (Salvador e Rio de Janeiro) onde pelo menos a sua veia artística pode ser vivida no rádio, no disco e na televisão. Ele tem sido alvo de pesquisas de estudantes aos quais forneço o que possuo mas seria ótimo que o Museu da Gente Sergipana fosse também alvo dessas pesquisas para todo tempo.
Por oportuno, entrego ao acervo desse museu, 2 exemplares do livro "João Ventura - Cidadão de Aracaju", onde João Mello (o próprio João Ventura) narra em especial para sua terra por auto adesão detalhes de sua vida em Sergipe, no Brasil e no mundo, já que sua obra chegou também, por diversos caminhos, a vários outros países - da Argentina à China.
Esperando que o livro de João Mello (2 exemplares) possa ser útil ao registro e às pesquisas que venham a ser desenvolvidas, deixo aqui consignado os meus protestos de admiração e respeito.

* Raymundo Mello é Memorialista
raymundopmello@yahoo.com.bra

Texto e imagem reproduzidos do site: jornaldodiase.com.br

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