Foto: Antônio Dourado,
Reproduzida do site: flickr.com/photos/tonhodourado
Postada por Isto é SERGIPE, para ilustrar o presente artigo.
Publicado originalmente no site do Jornal da Cidade, em 12/05/2016.
As Embarcações Tototós no Estuário do Rio Sergipe
e o Ofício
de Canoeiro: Patrimônio Imaterial Sergipano
Ivan Rêgo Aragão professor do Instituto Federal de Sergipe,
mestre em cultura e turismo
Por: JornaldaCidade.Net
No dia 14 de maio de 2016 encerrou a exposição temporária
“Tototó no Rio Sergipe”. Alocada no Museu da Gente Sergipana, esta exposição é
o resultado conjunto de instituições para a salvaguarda, divulgação e
continuidade de um patrimônio que faz parte da paisagem cultural, memória,
cotidiano e identidade das comunidades de Aracaju, Barra dos Coqueiros, Nossa
Senhora do Socorro, Santo Amaro das Brotas e Laranjeiras. Tendo sido iniciada
em 11 de agosto de 2015, em nove meses, a exposição foi visitada por mais de
40.000 pessoas, segundo informações do citado museu.
Patrimônio Cultural Imaterial.
Relativos à ampliação do conceito de patrimônio, o IPHAN
coordenou estudos que resultaram na edição do Decreto 3.551, de 04/08/2000,
instituindo o Registro de Bens Culturais de Natureza Imaterial e criando o
Programa Nacional do Patrimônio Imaterial (PNPI). Consequentemente, essas
determinações consolidaram o Inventário Nacional de Referências Culturais (INCR).
Segundo o IPHAN, o PNPI, viabiliza projetos de identificação, reconhecimento,
salvaguarda e promoção da dimensão imaterial do patrimônio cultural, visto que,
é um programa de apoio e fomento que busca estabelecer parcerias com
instituições dos governos federal, estaduais e municipais, universidades,
organizações não governamentais, agências de desenvolvimento e organizações
privadas ligadas à cultura e à pesquisa. Como informa Castro e Fonseca (2008),
por patrimônio cultural de natureza imaterial entendem-se os saberes, os
ofícios, as festas, os rituais, as expressões artísticas e lúdicas, que,
integrados à vida dos diferentes grupos sociais, configuram-se como referências
identitárias na visão dos próprios grupos que as praticam.
Patrimônio Cultural Naval Brasileiro.
Em 2008, o IPHAN lançou o projeto Barcos do Brasil cujo
objetivo central se pautava na preservação e valorização do patrimônio naval
brasileiro por meio de ações de proteção e diagnóstico de embarcações,
paisagens culturais, acervos históricos e fomento às atividades relacionadas
com os barcos tradicionais – pesca, culinária, artesanato, festejos, ofícios,
transporte de pessoas e mercadorias. Embora Sergipe possuísse a canoa de tolda
Luzitânia em Brejo Grande (SE) contemplada com ações de salvaguarda, recebendo
o Prêmio Nacional Rodrigo Melo Franco de Andrade de 2011 na categoria
“Preservação de Bens Móveis”, posteriormente, ações de inventariação e
diagnostico foram realizadas pelo IPHAN sobre o modo de fazer bote em São
Cristóvão e canoa em Indiroba, ambos os municípios sergipanos.
As Embarcações Tototós como Patrimônio Sergipano.
Através do Decreto-lei 7.320/11, sancionado pelo então
governador do estado de Sergipe, Marcelo Deda, as embarcações denominadas
“tototós”, desde 20/12/2011, são Patrimônio Cultural e Imemorial do Estado de
Sergipe. As tototós são embarcações simples, construídas em madeira, com cabine
para seus passageiros, que viajam sentados, cuja principal função é o
transporte de passageiros. Possuem cerca de três metros de largura e 15 metros
de comprimento e são batizadas com este nome graças ao som característico
emitido por seu motor e popa. Segundo consta pelos estudos e pesquisa, estas
embarcações transitam no estuário do rio Sergipe a partir do ano de 1948
(SANTOS; ARAGAO; SOUZA, 2016).
Após três anos de receberem o reconhecimento de bens
culturais singulares do estado, foi realizado um projeto para a salvaguarda do
oficio de canoeiro, área de ocorrência e conhecimento dos bens associados a
estas embarcações. Tendo como pontapé inicial, ações de medidas compensatórias
pelos impactos causados aos sítios arqueológicos Alphaville I e II,
empreendimentos localizados no município de Barra dos Coqueiros (SE), este
projeto de pesquisa e salvaguarda envolveu instituições como IPHAN, Alphaville
Empreendimentos e Museu da Gente Sergipana. As equipes da Integratio
Consultoria de Belo Horizonte em parceria com a Rosa dos Ventos Consultoria e
Pesquisa de Aracaju foram responsáveis pelo levantamento bibliográfico,
documental e pesquisa de campo. Como meio de entender as referências, sentidos
e significados que o patrimônio cultural naval em questão possui para a
população do entorno, a metodologia utilizada pela equipe seguiu a proposta do
Inventário Nacional de Referências Culturais – INRC (BRASIL, 2000).
Durante o trabalho in loco foram realizadas produção
fotográfica, vídeo documentário e entrevistas com os canoeiros a partir das
suas funções (proeiro, popeiro e carpinteiro náutico). A fim de inventariar as
tototós, ainda em campo, foram aplicadas fichas do Sistema Integrado de
Conhecimento e Gestão – SICG para cada uma das vinte e três embarcações
existentes. Com a utilização do software livre Quantum GIS, foi possível
elaborar mapas temáticos que contemplaram o universo da pesquisa. Como base
cartográfica, foi utilizado o atlas digital de Sergipe comtemplando a
localização da bacia hidrográfica e da foz do rio Sergipe; municípios
sergipanos com presença e roteiro de navegação das tototós pelo baixo rio
Sergipe.
Produtos Gerados após o Projeto de Pesquisa.
Após meses de pesquisas bibliográfica e documental, trabalho
de campo e visitas técnicas, foram gerados produtos como resultados do registro
das ações para o reconhecimento e salvaguarda das embarcações para além de um
patrimônio sergipano, mas no contexto de um bem cultural brasileiro. Dentre as
publicações, foram produzidas as cartilhas das tototós, livro da pesquisa do
IPHAN, catalogo da exposição temporária no Museu da Gente Sergipana, bem como,
texto publicado em capitulo de livro de abrangência nacional, todos com a mesma
temática: as embarcações tototós e o oficio de canoeiro. Além disso, foi
montada a exposição no hall do citado museu para que os visitantes sergipanos e
brasileiros pudessem se informar sobre a existência destas.
Medidas de Continuidade para as Tototós.
O projeto de salvaguarda das embarcações tototós e do oficio
de canoeiro ressaltou a contextualização histórica, social e econômica das
Tototós; o ofício dos canoeiros; o modo de fazer a embarcação. Identificou os
canoeiros detentores de conhecimentos ligados à fabricação e manuseio das
tototós; os bens relacionados ao ofício dos canoeiros e o contexto ambiental no
qual estão inseridas estas embarcações, bem como, a delimitação da abrangência
geográfica do ofício. Além disso, ações de continuidade foram propostas, tais
como: aplicação das medidas de segurança interna das embarcações e dos
atracadouros; desenvolvimento de estudos dos roteiros que poderiam ser
realizados pelas canoas; realização de cursos, palestras ou aulas práticas
voltadas à qualificação do atendimento dos canoeiros; cursos de carpintaria
náutica ou naval e a construção da sede da associação dos totozeiros;
elaboração de roteiros de turismo pedagógico, histórico-cultural e ecoturístico
pela mesma associação em parceria com as agências de receptivo de Aracaju e,
por fim, campanha publicitária voltada a apresentar as tototós como opção
econômica, limpa e prazerosa de passeio.
A Memória dos Canoeiros.
O projeto desenvolvido de janeiro a outubro de 2014 para a
salvaguarda do oficio de canoeiro, área de ocorrência e conhecimento dos bens
associados às tototós, acabou por resgatar as memórias dos canoeiros das 23
embarcações. Proprietários, proeiros e popeiros como José Edenilson, Pedro
Henrique de Almeida, Antônio Fonseca Ramos, Arnaldo Moura Santos, Cícero Romão
Farias Batista, Henrique Praxede dos Santos, Elenilson da Cruz (Careca), Aldair
de Jesus Pereira, Gilvan Ferreira dos Santos, Joselito Santos, Denise Jesus,
Adriano Jesus, José Carlos Moura, Maria José da Conceição, Maria Núbia Tavares
e José Américo, relataram suas lembranças vinculadas às vivências do trabalho e
modo de vida no contexto das tototós.
Publicações Consultadas:
BRASIL. Inventário Nacional de Referências Culturais – INRC.
Brasília: IPHAN, 2000.
BRASIL. Projeto barcos do Brasil. IPHAN, 2008.
BRASIL. Patrimônio Cultural Imaterial Brasileiro. Disponível
em: <http://portal.iphan.gov.br/>.
Acesso em: 21 jan. 2014.
SANTOS, G. N. dos; ARAGÃO, I. R; SOUZA, A. M. B. Patrimônio
cultural naval, história e meio ambiente: a salvaguarda das embarcações tototós
na região do estuário do rio Sergipe. In: CAMPOS, J. B; PREVÉ, D. R; SOUZA, I.
F. de. (Orgs.). Patrimônio cultural, direito e meio ambiente: perspectivas
sobre diversidades, cultura e memória. Vol. II. Curitiba: Multideia, 2016.
Texto reproduzido do site: jornaldacidade.net/artigos
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